Opinião

Chuva de paus, pedras e ovos: o que mudou no Brasil entre as duas caravanas de Lula

Chuva de paus, pedras e ovos: o que mudou no Brasil entre as duas caravanas de Lula

Em tempo (atualizado às 17h40): nada justifica a agressão de seguranças do ex-presidente Lula contra o repórter Sergio Roxo, de O Globo, que estava trabalhando na cobertura da caravana em Francisco Beltrão, no Paraná. Isso só serve para piorar piorar as coisas e incentivar mais violência. 
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Foto por: Ricardo Stuckert
O que foi uma festa de bandeiras e cantorias em 1994 virou uma guerra de paus, pedras e ovos em 2018.
Essa é a principal diferença entre as duas caravanas de Lula pelo Sul do país separadas por quase um quarto de século.
Mas não é a unica. Tudo mudou neste período para o bem e para o mal. O Brasil é hoje um outro país.
Eu estava lá em 1994 como assessor de imprensa de Lula e acompanho agora, de longe, com muita tristeza e preocupação, as notícias que chegam dos confrontos, relatando a ofensiva fascista contra a caravana deste ano.
Para começar, não havia extrema-direita na campanha daquele ano, que correu tranquila, sem incidentes. Vejam algumas diferenças:
  • Em 1994, o principal adversário de Lula era Fernando Henrique Cardoso, do PSDB, aliado ao PFL. Hoje, é o ex-capitão e deputado Jair Bolsonaro, do PSL, da “bancada da metralhadora”, sem aliados até agora. Lula estava aliado aos partidos tradicionais da esquerda.
  • Em 1994, o presidente era Itamar Franco, que deixou o país em ordem e limpo, sem nenhuma denúncia contra ele. Hoje, é Michel Temer, duas vezes denunciado por corrupção pelo MPF, acusado de liderar uma quadrilha instalada no Palácio do Planalto.
  • Em 1994, o principal problema dos brasileiros era a inflação, combatida pelo Plano Real, que acabaria dando a vitória a FHC no primeiro turno. Hoje, é o desemprego de mais de 12 milhões de trabalhadores, sem que nenhum pré-candidato tenha até agora apesentado qualquer plano para combatê-lo.
  • Em 1994, as campanhas eram movidas pela esperança num país melhor. Os debates eram civilizados. Hoje, o clima é de medo, desesperança e desalento com o futuro, sem perspectivas.
  • Em 1994, ninguém sabia quem eram os ministros do Supremo Tribunal Federal, o Judiciário não se metia na política. Hoje, a Justiça tem papel de protagonista da campanha eleitoral e seus supremos ministros aparecem mais na TV do que os candidatos.
A lista é grande, e eu poderia passar o resto do dia aqui enumerando as diferenças, todas elas para pior, depois de o país ter avançado bastante em todas as áreas nos 16 anos dos governos de Lula e FHC, com o Brasil sendo admirado e respeitado no cenário internacional.
Ainda em 2014, na reeleição da petista Dilma Rousseff, não nos esqueçamos, o país alcançava quase o pleno emprego, com índices de países nórdicos.
Começamos ali a descer ladeira abaixo, com a crise política e econômica que se seguiu, e a gestação da “Ponte para o Futuro” do vice Michel Temer, em aliança com o PSDB, o Judiciário e a mídia, que acabou derrubando a presidente.
E voltamos rapidamente ao passado pré-1994, com a destruição das conquistas sociais, uma a uma, dando lugar novamente à concentração de renda e de riqueza e à volta do Brasil ao Mapa da Fome.
Em quatro anos de Operação Lava Jato e dois anos de governo ultraneoliberal de Temer, a indústria nacional foi quase dizimada ou vendida, o mercado de trabalho precarizado e sem direitos, nossos recursos naturais e as maiores estatais colocadas em leilão, e não sobrou pedra sobre pedra do projeto de um país independente e orgulhoso de si.
Só sobraram algumas pedras para jogar nos palanques de Lula, alvo da ira dos que nunca aceitaram a ascensão política dos trabalhadores, juntando a elite rentista que ainda teme o “perigo do comunismo”, com os “bolsominions”, os “guerrilheiros virtuais” do MBL e os agroboys herdeiros de terras, nos ataques ao presidente que deixou o governo em 2010 com mais de 80% de aprovação popular.
Se a Justiça demora a prender e impedir Lula de ser candidato, querem agora eliminá-lo fisicamente para manter o poder por mais 500 anos.
A caravana de Lula chega hoje ao Paraná e só termina na quarta-feira, dia 28, justamente em Curitiba, onde fica o QG da Lava Jato de Sergio Moro, hoje o maior desafeto de Lula, o juiz que não vê a hora de mandá-lo para a cadeia.
Temo pelo que pode acontecer até lá. A disputa política saiu dos tribunais para o confronto nas ruas, sob os olhares cúmplices dos agentes de segurança encarregados de zelar pela integridade física dos caravaneiros do ex-presidente.
No meio desse far-west tropical no Sul em pleno século 21, com o Rio ocupado pelas tropas do Exército, Michel Temer, rejeitado pela quase totalidade do eleitorado, teve a coragem de lançar sua candidatura à reeleição, acredite se quiser.
Sem Lula no páreo, não se esqueçam, Bolsonaro é hoje o franco favorito nas eleições de outubro.
Sempre pode piorar, não corremos o risco de melhorar.
Que saudades de 1994, quando a disputa se dava entre FHC e Lula…
Vida que segue.

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