Extrema-direita cresce no Brasil e casos de intolerância também
Em
quatro meses, a palestra de uma feminista, uma peça de teatro e três
exposições de arte foram alvo da ira de manifestantes. Entretanto, o
candidato Bolsonaro sobe nas sondagens
No
intervalo de 48 horas, o aeroporto de Congonhas, em São Paulo, foi
palco de manifestações de violência. Uma delas, é comum no Brasil há
décadas: adeptos do clube de futebol Palmeiras insultaram os jogadores
da sua equipa, de regresso à cidade, após uma derrota. Outra, um sinal
dos tempos que correm: a filósofa feminista norte-americana Judith
Butler ouviu um coro de protestos, que resultou em empurrões e queixas
na polícia por injúrias. Desde as últimas eleições presidenciais em
2014, mas com maior incidência nos últimos meses, o chamado "clima de
Fla-Flu" - forma como no país se classifica uma rivalidade inflamada -
deixou de estar reservado ao futebol, propagando-se pelas áreas da
política e dos costumes.
"Quem
diria há uns cinco anos que uma palestra de uma professora
universitária iria dividir o país?", reagiu Pablo Ortellado, professor
da Universidade de São Paulo (USP), nas redes sociais. Butler,
referência mundial no estudo da teoria de género, ia participar numa
palestra organizada pela USP, mas enfrentou manifestantes de crucifixo
na mão e cartazes a dizer "queimem a bruxa" e "buzinem contra o ensino
da homossexualidade no Brasil". Na internet, uma petição para impedir a
sua comunicação organizada pelo ator Alexandre Frota chegava a 350 mil
assinaturas - "essa mulher que inventou a ideologia de género vai chegar
para incentivar isso nas escolas do Brasil, a vida dela não será
fácil", escreveu Frota.
A
primeira de uma série de manifestações de intolerância que culminou com a
palestra da filósofa ocorreu em agosto, quando uma exposição sobre a
diversidade sexual na história da arte brasileira, a Queermuseu, foi
suspensa em Porto Alegre por pressão do Movimento Brasil Livre (MBL), um
grupo que nasceu em 2014 durante os protestos contra a então presidente
Dilma Rousseff, entretanto destituída pelo Congresso Nacional e
substituída por Michel Temer. Segundo os críticos, a que se juntou a voz
do prefeito da cidade Nelson Marchezan, a exposição era "uma blasfémia"
contra símbolos religiosos. Marcelo Crivella, bispo da IURD e prefeito
do Rio de Janeiro, vetou a exibição da Queermuseu no Museu de Arte do
Rio (MAR) na sua cidade: "Essa exposição no MAR? Só se for no fundo do
mar". Deputados exigiram a presença do comissário da obra Gaudêncio
Fidelis no parlamento para se explicar. "É impensável, nem na ditadura
se via disto", reagiu Fidelis.
No
museu de arte de Campo Grande, Mato Grosso do Sul, uma pintura de
Alexandra Ropre foi retirada porque deputados locais viram na obra
promoção à pedofilia - "é obscena", acusou o parlamentar Paulo Siufi. Em
Jundiaí, São Paulo, um juiz interrompeu a peça "O Evangelho Segundo
Jesus", com um transexual no papel do profeta, por ser "atentatória à
dignidade da fé cristã". O Museu de Arte Moderna, em São Paulo, foi
atacado por grupos conservadores, e pelo prefeito da cidade e
pré-candidato à presidência João Doria, por causa de uma exposição com
um homem nu - o rastilho foi a divulgação de um vídeo onde uma criança,
acompanhada da mãe, toca a perna do modelo. "O ato daquele pilantra nu
não é só um ataque à moral do Brasil, mexe com o subconsciente dos
tarados que agora pensam que tudo se pode", disse no plenário da Câmara o
deputado João Rodrigues.
Alexandre
Frota, a maioria dos dirigentes do MBL e parte das lideranças
evangélicas apoia ou simpatiza com o candidato à presidência da
República em 2018 Jair Bolsonaro, o deputado que citou o torturador
Brilhante Ustra durante o seu voto a favor do impeachment de
Dilma e sugeriu o fuzilamento do antigo presidente Fernando Henrique
Cardoso a meio do mandato deste. Nas sondagens, Bolsonaro é quem mais
sobe: já está em segundo lugar, atrás apenas de Lula da Silva, com
números em torno dos 20%.
Em São Paulo
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