Gravação de ministro sobre Lava Jato abre crise no novo governo brasileiro
Um dos principais ministros de Michel Temer, Romero Jucá foi
apanhado em flagrante a dizer que a maior operação de combate à
corrupção no Brasil devia ser travada - e que a Presidente Dilma devia
ser afastada para isso acontecer
A Folha de S. Paulo divulgou excertos do diálogo trocado entre Jucá e Sérgio Machado, ex-presidente de uma transportadora de petróleo subsidiária da Petrobras, a Transpetro, semanas antes da votação na Câmara que desencadeou o impeachment (processo de destituição) da Presidente Dilma Rousseff. A conversa, que dura uma hora e 15 minutos, foi registada sem o conhecimento de Jucá. A Folha não informou como obteve a gravação, explicando apenas que ela se encontra em poder da Procuradoria-Geral da República (PGR).
No dialogo, Jucá diz que “tem que mudar o governo para poder estancar essa sangria”, numa referência à Lava Jato. Tanto Jucá como o seu interlocutor, Sérgio Machado, são alvo de investigação no âmbito daquela operação conjunta da Polícia Federal e Ministério Público. Machado, que dirigiu a Transpetro durante uma década, entre 2003 e 2014, foi denunciado por duas pessoas envolvidas no escândalo da Petrobras e o seu nome associado ao esquema de pagamentos de subornos que teve destinatários políticos, como o presidente do Senado, Renan Calheiros.
Romero Jucá está na lista de suspeitos que o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, enviou ao Supremo Tribunal Federal em Março pedindo a abertura de um processo relacionado com a Lava Jato. Enquanto senador, Jucá goza de imunidade parlamentar e só pode ser investigado sob autorização do Supremo. O seu nome apareceu em depoimentos de um ex-executivo da Petrobras, Paulo Roberto Costa, que foi detido e fez um acordo de colaboração com as autoridades. Jucá foi citado juntamente com outros 27 políticos supostamente beneficiários do esquema de subornos que vigorou em torno de contratos da Petrobras com outras empresas.
Há apenas três dias, o PGR pediu ao Supremo para abrir um outro inquérito contra Jucá e três outros políticos, todos do seu partido, o PMDB, por suspeita de terem recebido subornos pelos contratos relacionados com a construção de uma central hidroeléctrica no estado do Pará. Jucá foi um dos maiores opositores no Congresso à lei da Ficha Limpa, que torna inelegíveis políticos condenados em processos judiciais.
Na gravação obtida pela Folha, Sérgio Machado procura a protecção de Jucá face às investigações da Lava Jato e chega a fazer uma ameaça indirecta de incriminar políticos do PMDB se as autoridades chegarem a ele. "Aí fodeu para todo mundo. Como montar uma estrutura para evitar que eu 'desça'? Se eu ‘descer'..."
Segundo a Folha, Jucá concorda que o caso "não pode ficar na mão desse [Sérgio Moro, o juiz que comanda a Lava Jato]”.
Depois de referir o nome de empresários, como Marcelo Odebrecht, que foram detidos no âmbito da Lava Jato e aceitaram colaborar com as autoridades revelando a participação de terceiros, Machado sugere que ele é só um meio de os investigadores chegarem a figuras do PMDB. “O Janot [procurador-geral da República] está a fim de pegar vocês. E acha que eu sou o caminho.” Jucá: “Você tem que ver com seu advogado como é que a gente pode ajudar. Tem que mudar o governo para poder estancar essa sangria.” Machado, que foi uma indicação política do PMDB para a direcção da Transpetro, responde: “Rapaz, a solução mais fácil era botar o Michel [Temer]”, sugerindo, logo a seguir que Temer deve formar um governo de unidade nacional - exactamente o que o novo Presidente interino veio a fazer. “Com o Supremo, com tudo”, diz Jucá, referindo-se a um pacto que incluiria até o Supremo Tribunal, autoridade judicial que poderia travar ou pelo menos dificultar o andamento da Lava Jato. “Aí parava tudo”, diz Machado. “É, delimitava onde está, pronto”, diz Jucá.
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