Batidas
policiais em universidades. Ordens de prisão a professores e alunos por
posicionamento político contra o fascismo e a censura. A cena remete a
tempos de repressão no Brasil, tempos de medo, violência e ditadura. Mas
aconteceu em 2018, na última quinta-feira (25/10).
Ao
menos 27 instituições de ensino superior foram alvo de ação de agentes
do TRE e da polícia federal. O suposto objetivo era identificar e
recolher materiais de campanha irregulares – na prática, professores
foram abordados por sua “ideologia”; foram recolhidas faixas contra o
fascismo e em homenagem a Marielle Franco, vereadora assassinada em
março em um crime político ainda sem solução.
Segundo a agência alemã DW ,
“relatos dão conta que agentes entraram sem mandado formal nas
faculdades, retiraram faixas sem relação com a eleição e interromperam
debates”. Na noite desta quinta, uma juíza eleitoral de Niterói
determinou a prisão do diretor da Faculdade de Direito da Universidade
Federal Fluminense (UFF) caso uma faixa em que se lia “Direito UFF
Antifascista”, hasteada na entrada do campus, não fosse removida. Após a
ameaça da juíza, o diretor ordenou a retirada do material. Em seu
lugar, foram estendidos panos pretos simbolizando luto e uma faixa
laranja com a inscrição “censurado”.
A
Ordem dos Advogados do Brasil, seção do Rio de Janeiro, lançou nota em
repúdio à censura e à repressão. “A OAB-RJ manifesta o seu repúdio
diante de recentes decisões da Justiça Eleitoral que tentam censurar a
liberdade de expressão de estudantes e professores das faculdades de
Direito, que, como todos os cidadãos, têm o direito constitucional de se
manifestar politicamente”.
A
nota lembra, ainda, que a manifestação não alinhada a candidatos e
partidos não pode ser confundida com propaganda eleitoral. “Quaisquer
restrições nesse sentido, levadas a efeito, sobretudo por agentes da
lei, sob o manto, como anunciado, de ‘mandados verbais’, constituem
precedentes preocupantes e perigosos para a nossa democracia, além de
indevida invasão na autonomia universitária garantida por nossa
Constituição”, conclui.
Proibição de palestras contra o fascismo e abordagem policial a professores por sua “ideologia”
Da DW Brasil
No
Pará, policiais militares entraram no campus para questionar o
professor Mário Brasil, coordenador do curso de Ciências Sociais, sobre
sua ideologia, de acordo com um relato. Após abordar o tema das “fake
news” em uma aula da disciplina “Mídias Digitais”, uma estudante teria
se sentido ofendida, alegado “doutrinação marxista” e telefonado para
seu pai, soldado da PM.
Houve
casos em que palestras e debates sobre as temáticas da ditadura militar
e do fascismo foram proibidos. Foi o caso do evento público “Contra o
fascismo. Pela democracia”, previsto para ser realizado na Universidade
Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). O debate contaria com a
participação de Guilherme Boulos, que concorreu à Presidência pelo PSOL,
o ex-ministro Tarso Genro (PT), a deputada federal eleita Fernanda
Melchionna (PSOL) e a deputada federal Maria do Rosário (PT).
“Dei
aulas, proferi conferências em Universidades da França, Inglaterra,
Portugal, Espanha, Alemanha, Argentina e aqui, mesmo na ditadura.
Respeitei sempre os protocolos legais dessas casas de ensino. Hoje,
censurado para falar na UFRGS, no RS que governei. Fascismo cresce”,
escreve Tarso Genro no Twitter.
A
decisão do TRE local atendia a um pedido do deputado federal Jerônimo
Goergen (PP) e do candidato eleito Marcel van Hattem (Novo). Para
justificar a medida, o juiz cita o inciso um do artigo 73 da Lei das
Eleições, onde está exposto que não é permitido “ceder ou usar, em
benefício de candidato, partido político ou coligação, bens móveis ou
imóveis pertencentes à administração direta ou indireta da União, dos
Estados, do Distrito Federal, dos Territórios e dos Municípios,
ressalvada a realização de convenção partidária”.
O
juiz do TRE destaca que, pelo contexto, é nítido que o ato “se trata de
evento político-eleitoral, seja a favor do candidato Fernando Haddad,
seja contra o candidato Jair Bolsonaro”.
Nos
sindicatos e associações de professores em que foram realizadas
diligências da Justiça Eleitoral, além do recolhimento de materiais,
foram apreendidos também computadores. Uma nota do Sindicato Estadual
dos Profissionais da Educação de Campos dos Goytacazes (RJ) relata que a
diligência dos fiscais do TRE apreendeu exemplares informativos da
Confederação Nacional dos Trabalhadores da Educação “com o comparativo
das propostas para a educação dos dois candidatos à Presidência da
República, sem orientação de voto”.