Imigração em Portugal

Há mais 29 mil estrangeiros a viver em Portugal

Quando Maria Carolina Junqueira, 39 anos, chegou a Portugal - vive em Azeitão -, em 2016, tinha a vantagem de ter dupla cidadania, brasileira e italiana (o pai é de origem portuguesa, a mãe italiana), mas chegou como muitos outros sem saber ainda o que iria fazer. Em São Paulo era professora numa escola italiana e, dada a especificidade, nem pensou em manter-se no ensino. Tem uma agência de turismo "muito tradicional" e virada para o cliente português
Número de autorizações de residência em 2017 aumentou 19% comparativamente a 2016. Brasileiros e asiáticos em maior número
A imigração cresceu 19% no ano passado em comparação com 2016, a maior subida dos últimos cinco anos. O Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) concedeu 29 055 autorizações de residência (AR) a naturais de países terceiros à União Europeia (UE) em 2017, aproximando-se dos valores anteriores ao auge da crise. Estrangeiros que trabalham em Portugal, que se juntam a familiares que já cá estavam, que investem, estudam ou fazem investigação. Estas são as principais razões da entrada.
Nos últimos seis anos (ver gráfico), Portugal regularizou quase 150 mil imigrantes, permitindo-lhes a entrada no espaço Schengen ao abrigo da legislação da imigração (lei 23/2007, atualizada com a lei 102/2017). Os responsáveis do SEF sublinham que "são dados provisórios, em fase de consolidação". Não restam, no entanto, dúvidas de que o número destes cidadãos voltou a subir depois dos anos da crise. Em 2012 foram atribuídas 28 681 destas residências, baixando para 22 600 no ano seguinte, valores que se mantiveram até 2015. Seguiu-se uma subida de 9,3% em 2016, que foi mais significativa no ano passado (18,8 %).
Segundo o Inquérito ao Emprego do Instituto Nacional de Estatística, 2013 foi o período da crise em que o país teve menos pessoas empregadas: 4,3 milhões em janeiro desse ano.
A lei da imigração aplica-se aos "cidadãos estrangeiros e apátridas", com exceção dos nacionais "da UE, do Espaço Económico Europeu ou de um Estado terceiro com o qual a Comunidade Europeia tenha um acordo de livre circulação de pessoas", como a Suíça. Os que não estão incluídos nesta lista são os chamados "países terceiros".
Os dados são provisórios e só com a publicação do relatório do SEF, em junho, se poderá perceber as nacionalidades de quem mais contribuiu para o aumento de imigrantes, mas as associações que apoiam essas comunidades têm uma ideia: brasileiros e naturais da Ásia, também dos países de língua oficial portuguesa.
Temos mais mulheres imigrantes inscritas do que homens
"Temos mais mulheres imigrantes inscritas do que homens. Acompanhamos nacionais de diversas nacionalidades, como os oriundos de Brasil, Nepal, Paquistão, Índia, etc.", diz Patrícia Marques Brederode, do Gabinete de Inserção Profissional Casa do Brasil de Lisboa. Justifica a entrada de mais brasileiros com a "situação de instabilidade política e económica que atravessa o Brasil e que ocasiona o aumento do desemprego".
Também o presidente da Associação dos Nepaleses Residentes em Portugal, Kuber Karki, refere que a comunidade do seu país tem aumentado substancialmente, estimando que aqui vivam 20 mil, quatro vezes mais do que os indicados pelo SEF no relatório de 2016. "Muitos estão à espera da documentação e têm garantias de que a vão receber, mas também há nepaleses com dificuldades em obter a autorização de residência, trabalham, pagam os impostos e não se conseguem legalizar. Mas o que posso garantir é que querem viver em Portugal com a sua família. Gostamos muito do país, que é parecido com o Nepal, e as pessoas são muito simpáticas."
As associações que prestam apoio aos imigrantes criticam o SEF na análise dos processos. "Esse é o nosso maior problema para a sua integração: o atraso na regularização destas pessoas e que são superiores a um ano. Estes cidadãos têm todas as condições para se regularizarem e nem sequer obtêm resposta dos serviços", reclama André Costa Jorge, diretor do Serviço Jesuíta aos Refugiados.
Refere-se essencialmente aos estrangeiros de países terceiros que entram com visto na Europa, alguns já caducados, e que vão viajando até Portugal. Aqui trabalham e pagam Segurança Social, duas das condições para obter uma autorização de residência, ao abrigo do artigo 88.º. Exige-se também a entrada legal em território nacional, que muitos não têm mas houve alturas em que os serviços eram mais flexíveis quanto a esta matéria.
André Costa Jorge acusa os serviços públicos de nem sequer responderem aos pedidos de esclarecimento. "O SEF não olha para as instituições numa lógica de parceiros, quando tem de olhar numa lógica de colaboração, seja em programas de colocação no mercado de trabalho seja de integração." Acrescenta que não seriam necessárias alterações à lei ou regimes de exceção para regularizar a maioria dos indocumentados. Tem esperança de que as coisas mudem com a nova direção do SEF, em funções desde outubro. "Espero que possa retomar um caminho de parcerias e articulação que culminem em boas práticas de integração."
Os dirigentes do SEF reconhecem a existência de problemas, nomeadamente no atendimento na área da Grande Lisboa. "É onde existe maior pressão, com uma dilação superior no tempo para o agendamento." Acrescenta que a prioridade "tem sido otimizar os recursos humanos", promovendo "uma distribuição dos atendimentos por todo o território nacional e uma harmonização de procedimentos, diminuindo a pressão junto dos locais situados nos maiores aglomerados populacionais, aumentando assim a capacidade de resposta às necessidades dos cidadãos estrangeiros".
No ano passado, foram emitidas 3403 AR, mais 43% do que em 2016, ano em que se ficou pelos 2381, uma grande quebra comparativamente a 2015 (3878 ), que tinha subido 30% em relação a 2014 (2982). Em 2012 e 2013 ultrapassaram as quatro mil. Os cidadãos estrangeiros de países terceiros também se podem regularizar se trabalharem por conta própria (artigo 89.º), mas são poucas as situações. Registe-se no entanto a atribuição de 61 destas residências no ano passado, três vezes mais do que em 2016 (19).
Timóteo Macedo, presidente da Associação Solidariedade Imigrantes, sublinha que o número de trabalhadores imigrantes regularizados é irrisório face à realidade. "Os processos estão a demorar muito tempo, alguns mais de dois anos, as pessoas continuam a chegar para trabalhar e não lhe é dada uma resposta", critica o dirigente. Estima que existam 30 mil imigrantes em situação irregular.
Em comparação, é mais elevado o número de AR atribuídas a quem investe no país, seja através da criação de emprego (poucos casos) ou de aquisição de casa de valor superior a 500 mil euros. Em 2017, 1351 investidores ganharam a residência legal, especialmente chineses, a que se juntaram 2678 familiares.
"Com ou sem visto, existo!" é o slogan da associação para as manifestações do 25 de Abril e do 1.º de Maio. Timóteo Macedo promete: "No dia 14 de maio vamos fazer a maior concentração em frente ao Parlamento para exigir documentos para todos e direitos iguais!"

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