Opinião

As práticas antirrepublicanas do governo Temer

Poucos governos na história do Brasil utilizaram tanto os poderes e o orçamento do Estado para se livrar de processos e patrocinar os interesses do capital quanto o governo Michel Temer. E os órgãos de controle, tão atentos a outros governos, fazem vista grossa ao uso descarado da máquina pública para a defesa de interesses pessoais e de grupos, inclusive comprometendo as finanças públicas e desmontando o Estado de Bem-Estar Social.
A Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) em vigor proíbe, expressamente, em seu artigo 144, que a execução da lei orçamentária e dos créditos adicionais seja utilizada para influir na apreciação de proposições legislativas em tramitação no Congresso. Contrariar essa norma é crime de responsabilidade contra a LDO, nos termos do artigo 10, item 4 da Lei nº 1.079/50, classificado como tal a quem “infringir, patentemente, e de qualquer modo, dispositivo da lei orçamentária”. Estamos diante de reiterada prática desse delito, o que mostra a fragilidade do sistema de controle quando, efetivamente, tais crimes são cometidos.
Em troca de votos pela rejeição de duas denúncias, o governo promoveu um verdadeiro festival de concessões, tanto aos parlamentares quanto àqueles que ajudaram na rejeição das denúncias, entre os quais alguns segmentos empresariais. São exemplos disso a liberação de emendas parlamentares, as renúncias fiscais para prefeitos, as isenções de multas e os parcelamentos de dívidas dos ruralistas, a renúncia de tributos para as multinacionais do petróleo, a entrega do pré-sal, a reforma trabalhista, entre outros.
Para o pagamento dessa fatura, escamoteada em nome da modernização da economia e das relações de trabalho, o governo tem feito uso de medidas provisórias para conceder vantagens ao setor privado, seja liberando espaço para a prática da atividade empresarial, mediante concessão ou alienação de atividades exploradas por estatais, seja facilitando a vida dos sonegadores, dando-lhes anistias, isenções e parcelamentos generosos, incluindo prefeitos e governadores.
A relevância e a urgência, indispensáveis à edição de medidas provisórias, são requisitos absolutamente desprezados. Os critérios fundamentais para editar medidas provisórias são o pagamento de apoio à derrubada das denúncia e à sustentação desse governo ilegítimo e impopular, que cada vez mais cede à pressão do mercado pela desregulamentação da economia e pela redução do gasto público, especialmente no campo da seguridade.
A investida para viabilizar a reforma da Previdência, valendo-se de uma campanha infame contra os servidores públicos, tem o nítido propósito de favorecer a previdência privada e aberta, tanto que, expressamente, autoriza que os fundos fechados de previdência sejam operados por bancos e seguradoras privadas.
A Previdência Social – que pode e deve observar critérios financeiros, demográficos e atuariais – tem sido objeto de grande manipulação para viabilizar sua privatização, na medida em que a torna desinteressante para os trabalhadores, com exigências inatingíveis pelos segurados. Ela, no formato proposto, está sendo feita para aumentar idade, ampliar tempo de contribuição e reduzir o valor do benefício. Ao mesmo tempo, o governo infunde o medo na sociedade de que a Previdência pública será incapaz de assegurar os benefícios já concedidos, e menos ainda os a conceder.
A Emenda à Constituição nº 95, que congela o gasto público em termos reais por vinte anos e transforma a despesa e não a receita em referência orçamentária, cria a falsa impressão de que a Previdência é a responsável pela crise fiscal brasileira. Ora, com o orçamento congelado, as aposentadorias e o Benefício de Prestação Continuada (BPC) sendo concedidos, uma vez que as pessoas adquirem o direito a requerer o benefício, é óbvio que a despesa previdenciária e de assistência social aumenta.
A complacência dos órgãos de fiscalização com esse desvio de finalidade e o apoio do empresariado e da mídia comercial têm levado a uma certa apatia da população, que, por assimetria de informação, não reage à altura. Tem sido iludida e ludibriada dia e noite e não consegue perceber o que está em jogo: o desmonte do Estado de proteção social.
Esse tipo de política suicida vai levar, inexoravelmente, ao colapso do Estado na prestação de serviços públicos. E, nas eleições de 2018, o eleitor, privado do emprego e dos serviços públicos, certamente rejeitará essa política e todos aqueles que a têm praticado ou apoiado. A punição há de ser, além da não renovação dos mandatos, também com responsabilização civil e penal pelos males causados ao povo em geral e aos mais pobres, em particular.

Antônio Augusto de Queiroz é jornalista, analista político e diretor de Documentação do Diap

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