O terceiro andar do Planalto
O
sistema nervoso do Brasil é Brasília. A coluna vertebral de Brasília é a
Praça dos Três Poderes. O cérebro da Praça dos Três Poderes é o Palácio
do Planalto. O coração do Palácio do Planalto é o seu mítico terceiro
andar, onde se situam o gabinete presidencial e os escritórios dos
assessores especiais do chefe de Estado.
Um
zoom nesse terceiro andar dá o retrato da situação política desesperada
em que o país se encontra desde que Michel Temer foi gravado na semana
passada a conversar às escondidas pela noite dentro num porão com o
empresário corrupto Joesley Batista.
No
corredor contíguo ao gabinete do presidente, dos cinco assessores
especiais da presidência que por lá trabalhavam só sobra - até ver - um:
o assessor jurídico Gastão Toledo. Os outros quatro, com o nome
atingido por casos de corrupção, saíram em 2017. Três deles na semana
passada. Dois deles num intervalo de 24 horas.
O
último foi o ex-deputado Sandro Mabel, responsável pela relação entre o
chefe de estado e os empresários - uma relação que, soube-se agora, é
mantida em reuniões clandestinas em palácios oficiais e irrigada por
entregas de malas carregadas de dinheiro. Ora Mabel, que foi citado na
Operação Lava-Jato como suposto beneficiário de pagamentos ilegais da
construtora Odebrecht, apresentou na quinta-feira passada uma longa
carta de demissão.
Na véspera,
o assessor Tadeu Filippelli fora exonerado por Temer após ser preso
pela polícia federal no âmbito de uma operação que investiga desvio de
dinheiro - a ninharia de 900 milhões de reais, ou cerca de 270 milhões
de euros, divididos entre ele e mais nove criminosos - num estádio do
Mundial de futebol de 2014, o Mané Garrincha, em Brasília.
Horas
antes, Rodrigo Rocha Loures, o deputado que foi filmado pela polícia a
correr pelas ruas com 500 mil reais de subornos dados por Joesley
Batista supostamente a Temer, entregou numa esquadra a mala em causa mas
com apenas 465 mil reais (onde foram parar os 35 mil da diferença ainda
ninguém sabe). Afastado pelo Supremo Tribunal Federal do cargo de
deputado após as comprometedoras imagens, também já abandonou o gabinete
presidencial, no qual funcionava como homem para todo o serviço - no
Brasil chamam a esse tipo de gente "um aspone", as duas primeiras letras
de "assessor de porra nenhuma".
Em
janeiro, demitira-se José Yunes, amigo de Temer desde os bancos da
Faculdade de Direito de São Paulo, ao ser acusado pela Lava-Jato de ter
recebido no seu escritório uma embalagem da Odebrecht com um milhão de
reais destinada ao PMDB, o partido que herdou o terceiro andar do
Planalto após o impeachment de Dilma, a pedido de Eliseu Padilha.
Padilha
que é o ministro-chefe da Casa Civil, cargo mais influente do governo,
logo após o de presidente. Ele e Moreira Franco, ministro da Secretaria
Geral, são considerados os braços direitos de Temer. Um e outro são
acusados de terem recebido subornos da Odebrecht, a última mancha dos
seus largos cadastros.
Os
outros dois escolhidos por Temer na constituição do governo em maio
passado para se ocuparem da gestão política diária do governo, Romero
Jucá e Geddel Vieira Lima, acabaram demitidos a meio do caminho. O
primeiro, 15 dias após a posse, por ter sido alvo de escutas em que
dizia que queria "estancar a Lava-Jato" e o segundo, por ter pressionado
o ministro da Cultura à época a permitir a construção de um apartamento
da sua família numa zona tombada.
Temer
é, também ele, investigado desde a semana passada pelo Supremo por
corrupção passiva, organização criminosa, obstrução de justiça e
prevaricação, na sequência da gravação da tal conversa com Joesley
Batista, em que de acordo com a polícia concordava com o pagamento de
subornos a Eduardo Cunha, ex--presidente da Câmara dos Deputados hoje
detido na Lava-Jato, em troca do seu silêncio.
Por
meio de eleições diretas ou indiretas, o certo é que o mítico terceiro
andar, coração do Palácio do Planalto e por extensão do Brasil, precisa
urgentemente de um transplante.
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