Xadrez do desmonte da democracia
SEG, 05/12/2016 - 06:55
Peça 1 – os referenciais para analisar a crise
Os referenciais em
torno dos quais montaremos nossos cenários:
1.
O maior agente político continua
sendo a massa dos bestificados que saem às ruas impulsionados pelo ódio e pela
intolerância exarados pela mídia e pela Lava Jato.
2.
Quase todas palavras de ordem
pré-impeachment se esvaziaram. Agora, o alvo da mobilização é o Congresso, com
todos seus defeitos, o último setor de manifestação do voto popular. E a turba
sendo engrossada por procuradores e juízes, em uma nítida perda de rumo das
instituições.
3.
Agora, se tem um Judiciário
brigando com o Legislativo, procuradores de Força-Tarefa assumindo a liderança
da classe, se sobrepondo ao Procurador Geral, em um quadro de indisciplina
generalizada e crescente.
4.
Esse clímax se dará com a revelação
das delações da Odebrecht, tornando mais aguda a crise, a desmoralização da
política e a busca de saídas milagrosas.
5.
Se terá então a crise econômica se
ampliando, o vácuo político se acentuando, e massas raivosas atrás de qualquer
solução, por mais ilusória que seja, como esse cavalo de batalha contra a Lei
Anti-abusos.
Vamos montar, por
partes, esse mapa do inferno.
Peça 2 – o fim de Temer, o breve
A economia se moverá
seguindo o roteiro abaixo:
1.
O governo Michel Temer acabou.
Trata-se de um político menor e pior do que as piores avaliações sobre
ele.
2.
A era Henrique Meirelles também
acabou.
3.
O país está à beira de uma
depressão, com convulsão social e com um governo sem diagnóstico e sem condição
de comandar a recuperação. Mas o mercado
insistirá em uma última tentativa, seguindo o jogo das expectativas sucessivas,
conforme você poderá conferir no artigo “Como o marketing reduziu a economia a
um produto de boutique”( https://is.gd/WXBqJW).
Henrique Meirelles e
sua tropa deixarão de ser a equipe brilhante que salvaria a economia. Daqui para
a frente, serão colocados no limbo, e a nova equipe brilhante será a do
ex-presidente do Banco Central Armínio Fraga, que é um Meirelles elevado à
tríplice potência.
O problema da equipe
econômica que assumiu as rédeas é que o seu objetivo não é o de recuperação da
economia, impedindo um desastre social, mas o de destruir qualquer vestígio do
modelo anterior, um ideologismo barato e cego, marca, aliás, de boa parte do
pensamento econômico brasileiro.
Peça 3 – o governo de transição
Com o fim do governo Temer, aventa-se uma eleição indireta com
Fernando Henrique Cardoso, trazendo Armínio Fraga para aprofundar o ajuste
fiscal.
Aparentemente, essa loucura não se consumará por dois
motivos.
Motivo 1 – FHC refugou.
Em duas manifestações
seguidas, FHC admitiu o óbvio: sem a recuperação do voto, através de novas
eleições diretas, será impossível a implementação de qualquer programa econômico
minimamente consistente. Na verdade, FHC tem noção de suas próprias limitações.
Em momentos menos graves – como no processo inicial de consolidação do Real e no
início do segundo mandato – FHC foi incapaz de uma ação proativa sequer.
Limitou-se a seguir o receituário de seus economistas, de um enorme aperto
fiscal, que contribuiu, nos dois casos, para uma economia estagnada durante seus
dois mandatos.
Motivo 2 – a aposta
errada no aperto
Além disso, caiu a
ficha da classe empresarial sobre a loucura de persistir nessa política suicida.
Mesmo no mercado, a sensação é que a persistência do quadro recessivo não
permite ganhos a ninguém, mesmo ao mercado. E abre o risco de algum populismo de
direita, que transforme o mercado no bode expiatório.
A discussão que se
iniciará agora é sobre o momento e a oportunidade das novas eleições diretas,
uma discussão que levará em conta o potencial eleitoral de Lula e do PT e as
alternativas do atual grupo de poder.
O fator Nelson
Jobim
Com o PSDB pedindo
para afastar de si este cálice, o nome mais forte aventado – lembrado pelo
Xadrez de algumas semanas atrás – é do ex-Ministro da Defesa e ex-Ministro do
Supremo Nelson Jobim. Tem bom trânsito junto ao PSDB e ao PT e familiaridade com
as Forças Armadas, pela condução do Plano Nacional de Defesa.
Como presidente, será
uma incógnita. Como candidato potencial, é a melhor aposta até
agora.
Mas todas essas
alternativas caminham sobre o pântano, representado pelo estímulo fascista às
manifestações de rua. Abriu-se nova temporada de estímulo à violência, mostrando
que a marcha da insensatez se abateu também sobre os operadores da
lei.
Peça 4 - sobre a irresponsabilidade dos golpistas
Não era surpresa para
quem tem um mínimo de visão e de responsabilidade institucional. O golpe
desmontou definitivamente a democracia brasileira, o modelo que garantiu o
equilíbrio político do país desde a Constituição de 1988. Uma mescla de
aventureirismo, oportunismo, despreparo, covardia promoveu a abertura da Caixa
de Pandora.
Agora, a democracia
está desmontada, a economia caminhando para uma depressão. E, no momento, o que
se tem é o seguinte:
·
O Executivo
liquidado.
·
Uma campanha pesada visando
inviabilizar o Congresso.
·
Uma briga de foice entre
instituições, com uma cegueira generalizada sobre a gravidade do atual
momento.
·
E a ultradireita sendo
definitivamente bancada pela parceria Lava Jato-Globo.
O fato de um mero
procurador regional ousar afrontar o Congresso em nome pessoal, ameaçando “pedir
demissão” de uma força-tarefa para o qual ele foi indicado, mostra a
desmoralização institucional do país e a quebra total de hierarquia no próprio
Ministério Público Federal. Qualquer deslumbrado, com um metro e meio de
autoridade, e uma tonelada de atrevimento, coloca em corner não apenas o
Congresso, mas o próprio Procurador Geral.
Até onde irá esse
clima? Difícil saber.
Com a delação da
Odebrecht, os procuradores da Lava Jato insuflando as manifestações, a crise se
aprofundando, o caldeirão das ruas entrará novamente em ebulição, sem que haja
uma saída institucional à vista.
A crise começou seu
trabalho de espalhar um pouco de bom senso. Mas ainda é uma gota em um oceano de
insensatez.
Nenhum comentário:
Postar um comentário