O golpe visto de fora

'El País': Dilma não era o maior troféu

El País analisa que a verdadeira intenção do impeachment é a queda de Lula e do PT

A edição desta quarta-feira (14) do jornal espanhol El País traz uma análise sobre os interesses por trás do impeachment de Dilma Rousseff. Discutir se a destituição da presidente, tecnicamente irretocável, devido a irregularidades orçamentárias foi ou não um golpe de Estado é perda de tempo. O que importa é saber quais são os interesses político-econômicos altamente conservadores que chegaram à conclusão de que era preciso tirá-la da frente para chegar à peça principal, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A primeira presidente da história do Brasil era uma ótima integrante do elenco, mas a presa maior é o patriarca da esquerda social democrata do Brasil.
Segundo a reportagem o impeachment de Dilma Rousseff era um passo necessário para preparar o terreno para a eleição presidencial de 2018, para a qual o líder e criador do Partido dos Trabalhadores anunciou que pretende se candidatar. Mas, ao mesmo tempo, o que era antes a oposição, hoje representada pelo presidente Michel Temer, cuja trajetória histórica poderia ser classificada como de centro-direita e a posição atual de totalmente neoliberal, pode ter feito um favor a Lula, livrando-o de uma ex-presidente que se tornara um estorvo. Aquela que antes havia sido chamada de “gerentona”, que guardava a cadeira para o seu chefe, o qual já presidira o país de 2002 a 2010 e não poderia se apresentar a não ser nas eleições seguintes, chegou exausta ao afastamento temporário do cargo em maio passado e à deposição definitiva no início deste mês.
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A queda começou em 2014, com uma crise econômica acelerada, após alguns anos nos quais o PT e Lula se vangloriavam, com um otimismo calcado em estatísticas, de ter elevado 30 milhões de pessoas à classe média e de ter praticamente erradicado a miséria no país. E Dilma havia reagido a essa crise com instintos conservadores impecáveis, aceitando a necessidade de cortes e apertos orçamentários, o que se mostrou, porém, totalmente insuficiente.
As eleições municipais de outubro darão uma ideia aproximada da força que Lula e o PT ainda têm
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El País lembra que em março, a Promotoria acusou Lula de ocultação de patrimônio e lavagem de dinheiro, por conta de uma luxuosa propriedade que estava em nome de uma empresa beneficiada com contratos do Estado e investigada na chamada Operação Lava Jato; um apelido, na verdade, para a disputa pelo controle da Petrobras, a grande empresa brasileira de cujas comissões, distribuição de cotas e desvios vários se alimentou metade da classe política brasileira; e em agosto o Supremo abriu uma investigação contra ambos, Dilma e seu chefe, por obstrução à Justiça, isso tudo dentro do escopo da investigação sobre a Petrobras. E a política de privatizações, que Temer anunciou, já que é preciso fazer alguma coisa, é a questão de fundo; uma privatização que atingiria a gigantesca riqueza do petróleo, que, ao que parece, é um mar dentro do oceano, negando à Petrobras a exclusividade na exploração das camadas do chamado pré-sal; para a qual um Lula da Silva em plena posse de suas faculdades políticas constituiria, certamente, um sério obstáculo.
O jornal espanhol finaliza com afirmação de que todo esse jogo, essa emboscada ou esse tour de force poderão começar a revelar seus reais interesses em outubro nas eleições municipais. Com seus resultados, será possível verificar, de forma aproximada, em que condições Lula e o PT continuarão no campo de batalha.

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