Quando a China assusta o mundo

Medidas chinesas podem provocar corrida pela desvalorização de moedas, alerta economista

Professor do Instituto de Economia da UFRJ, Eduardo Costa Pinto vê perigo na depreciação do yuan

A divulgação de dados preocupantes para a economia chinesa, mostrando que sua desaceleração pode ser mais rápida do que se esperava, fez com que o governo da China, dentre outras medidas, desvalorizasse sua moeda para estimular as exportações do país. Para Eduardo Costa Pinto, professor do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (IE/UFRJ), a depreciação do yuan é um perigo para a saúde financeira global. “Esse movimento chinês tem que ser muito controlado porque, mais do que um dumping, pode abrir uma corrida de desvalorização de moedas para concorrer com as exportações chinesas. É um grande perigo porque tende a gerar inflação e isso não tem fim”, afirma.
De acordo com o economista, a desaceleração da China já era programada por seu governo, que tenta modificar a base econômica do país apostando na ampliação do consumo de suas famílias. Com a economia chinesa esfriando mais rápido do que o esperado, os governantes retomaram temporariamente a política de exportações para manter sua meta de crescimento, tendo na desvalorização do yuan uma das medidas para alcançar esse objetivo.
Na visão de Costa Pinto, entretanto, o cenário mundial está muito incerto e mesmo esses movimentos de depreciação podem não ser suficientes para reativar as exportações chinesas. “Isso porque a Europa está com um crescimento muito baixo e os países em desenvolvimento, que são um dos principais mercados consumidores da China pós-crise de 2008, também desaceleraram muito”, explica. Ele ainda ressalta que, embora os Estados Unidos tenham acelerado sua economia, seu coeficiente de importação caiu de forma expressiva.
Além de não alcançar efeitos tão significativos, o professor avalia que a medida pode desencadear uma corrida de desvalorizações monetárias ao redor do mundo. Autoridades chinesas sinalizam que a série de depreciações do yuan já chegou ao fim, mas Costa Pinto alerta que isso só é verdade até o momento em que outro país, em especial os Estados Unidos ou alguma nação da Europa, também ajustar seus papeis de forma significativa para tentar fazer frente aos produtos da China. “É como se você estivesse em um jogo esperando que o outro não fosse reagir. Se o outro reage, o governo chinês, mesmo não querendo, vai ter que fazer um movimento maior, senão não vai conseguir ativar suas exportações”, esclarece.
Embora tenha crescido nos últimos anos, o custo da mão de obra chinesa continua significativamente abaixo do que se pratica no Ocidente. Aliada a isso está uma estrutura tributária fortemente voltada ao comércio exterior, o que resulta na devolução de todos os impostos no ato da exportação. Embora não seja considerada uma prática de dumping, a estrutura permite à China diminuir sua margem de lucro e trabalhar com produção em grande escala. “Os subsídios estatais para alguns setores também são muito fortes. Isso faz com que a capacidade de concorrência deles seja impressionante”, completa Costa Pinto.
No Brasil, o cenário é quase o oposto: “A nossa estrutura tributária é muito ruim para o exportador. Ela é pautada em crédito tributário, o que dificulta as exportações porque os tributos vão estar embutidos no preço.” Embora ache positivo que se faça uma reforma no setor, o professor da UFRJ pondera que a atual conjuntura brasileira afugenta qualquer possibilidade de debate a esse respeito, pois as mudanças afetariam o caixa do governo em um momento que se deseja aumentar a receita.
Em setores como alumínio e aço, a China tem elevado consideravelmente suas exportações, graças ao excesso de capacidade de produção e à desaceleração de sua economia. Em resposta, muitos países já levaram o país à Organização Mundial do Comércio alegando a prática de dumping, quando se coloca no mercado produtos abaixo do preço de custo. De acordo com o professor da UFRJ, todas as tentativas foram desconsideradas e o assunto deverá ser tratado no âmbito do Fundo Monetário Internacional.
O cenário ainda é cheio de incertezas e o perigo de uma corrida de desvalorizações, iminente. Problemas na China, segunda maior potência mundial, afetam o mercado como um todo. Nesse sentido, o Fed já estuda não aumentar a taxa de juros norte-americana em sua próxima reunião, em setembro. “Porque a possibilidade de aumentar a taxa e causar um colapso mundial é gigantesca. Elevando a taxa, os EUA atraem dólares que estão circulando no mundo, então isso aumentaria ainda mais a desvalorização cambial dos outros países”, conclui.

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