Rede Globo irrita elenco e autor de “Império” ao cortar cenas de afeto entre homens
Eis que surge um travesti, uma espécie de Vera Verão com sobrepeso, que dorme na mesma cama que a amiga curvilínea e sempre de baby-doll, vivida por Viviane Araújo. Há ainda um romance entre um homem na faixa dos 50 anos e uma ninfeta, cenas de striptease masculino e um casal de pais cafetões que aliciam os próprios filhos.
Mas parece que a emissora voltou para o armário quando alguém gritou: “Cooortaaaaa!”. A tesoura da Globo começou a atuar pra valer em “Império”, antes e depois de os capítulos serem gravados. E a mutilação atingiu em cheio os personagens mais polêmicos e as cenas mais “calientes” da novela.
A reportagem apurou que beijos gays, sexo, nudez e palavrões entraram na mira da turma do “melhor não”, que passou a editar capítulos da trama, para surpresa do autor e do elenco, que reclamaram dentro do canal e nas redes sociais.”Até [a novela infanto-juvenil] Chiquititas’ tem mais sexo que Império’”, cutucou Aguinaldo Silva no Twitter.
“Sem sexo não existem famílias”, alfinetou, também no Twitter, o ator Alexandre Nero, que protagoniza a trama. O veto a cenas é apoiado em pesquisas do canal que reforçam a presença de um público mais conservador entre a sua audiência no horário.
Procurada pela reportagem, a Globo disse que a edição das cenas é uma dinâmica regular realizada em todos os seus produtos. O elenco e o autor da novela também foram procurados, mas não quiseram se manifestar.
Desde o famoso sumiço do beijo gay na novela “América” (2005), a audiência da Globo tem mostrado em pesquisas que não é contra a discussão de temas ligados às comunidades gays. O que não significa que esse público aceite bem as cenas de amor envolvendo pessoas do mesmo sexo.
Segundo fontes da emissora, a pesquisa de opinião feita com o público de “Império” mostra que os homossexuais da trama são queridos, mas o telespectador comum ainda não quer encarar cenas de beijos e “pegação” entre eles. “A TV tem acompanhado as transformações da sociedade, mas não vemos o mesmo tratamento dado para os personagens heterossexuais, homossexuais e bissexuais nas novelas”, diz Victor De Wolf, secretário-geral da Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais, a ABGLT.
Segundo Daniela Jakubaszko, autora de tese de doutorado na USP sobre a representação da masculinidade na telenovela, folhetins são feitos para dialogar com um público amplo e tentam se manter no “senso comum”. “É possível que, após o beijo gay, a emissora precise voltar ao diálogo com o segmento conservador. Um passo para frente, um ou dois para trás, e assim vamos avançando lentamente”, afirma Daniela. “A audiência masculina cresceu, e rejeitaria a novela por sempre mostrar beijos homossexuais, porque somos um país machista, certo?”.
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