Furto, associação criminosa e dano ao patrimônio podem levar manifestantes pra cadeia

Polícia de São Paulo indiciou 1/3 dos detidos durante protestos

Durante as manifestações de rua que reverberaram no país a partir de junho, 374 pessoas foram levadas para delegacias de polícia em São Paulo e registradas em boletins de ocorrência.
Dessas, quase um terço (116) foi indiciada em flagrante, em sua maioria sob acusação de crimes como furto, associação criminosa e dano ao patrimônio.

Os dados foram coletados pela Folha nos 160 boletins de ocorrência registrados desde junho na capital.
O levantamento começa a partir do ato do MPL (Movimento Passe Livre) contra o aumento da tarifa de ônibus de São Paulo, marco zero dos protestos que tomaram conta do país e que completam seis meses amanhã.
O indiciamento significa que os delegados que registraram os casos se convenceram de que há elementos suficientes para imputar aos suspeitos a autoria de crimes.
Em tese, significa que eles têm mais chances de se tornarem réus, mas isso ainda depende da conclusão das investigações e do posicionamento do Ministério Público.
Advogados de defesa de manifestantes detidos afirmam que as prisões foram arbitrárias e que, nas delegacias, os indiciamentos foram feitos de forma aleatória.
Na versão deles, ocorria o que chamaram de "rifa do B.O.", em que crimes ocorridos durante as manifestações eram distribuídos entre aqueles conduzidos aos DPs.
A Secretaria da Segurança Pública nega a prática e, em nota, diz que considera que "de maneira geral, o trabalho das polícias Civil e Militar transcorreu de maneira legal".
Afirma ainda que os manifestantes contra os quais não havia indícios da prática de crimes foram liberados. E que as denúncias de abusos policiais "estão sendo ou foram investigadas".
As prisões --e as acusações contra a polícia-- ganharam corpo à medida em que entraram em cena os adeptos da tática black bloc, que prega a destruição do patrimônio como forma de protesto.
Seis meses após o primeiro protesto, ao menos duas pessoas foram denunciadas pelo Ministério Público sob acusação de lesão corporal, desacato e dano e respondem a ação penal na Justiça.
Elas são acusadas de agredir o policial Wanderlei Paulo Vignoli, que foi cercado por participantes de um ato no centro de São Paulo e empunhou sua arma contra manifestantes para afastá-los, sem, contudo, atirar.
A cena ilustrou a Primeira Página da Folha do dia 13 de junho e foi vencedora do Prêmio Esso de Fotografia.
Vignoli não reconheceu seus agressores. A acusação contra eles tem como base o depoimento de um outro PM.
Três em cada quatro boletins de ocorrência têm como principal fonte de informação testemunhos de policiais ou guardas municipais.
O ponto é controverso. A Secretaria da Segurança Pública diz que isso é natural uma vez que "num ambiente de tumulto, é difícil arrolar testemunhas civis".
Outros juristas afirmam que é possível produzir evidências, especialmente durante atos convocados com antecedência, evitando prisões arbitrárias e melhorando a qualidade dos flagrantes. Citam, como exemplo, fotos e vídeos. "Existe uma seletividade na coleta das informações", avalia a defensora pública Daniela Skromov.
O Departamento de Investigações Criminais da Polícia Civil abriu um único inquérito para investigar os detidos. Pretende, segundo seu diretor, Wagner Giudice, "separar o joio do trigo". Para isso, infiltrou investigadores em sites e tem convocado "lotes" de até 80 manifestantes para depor no mesmo horário e local.

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