A vida além do ciúme


Insatisfeitos com PT, deputados do PMDB podem dar trabalho nas próximas votações

Batalha na aprovação da MP dos Portos deixou exposta fissura na relação entre aliados da base

Eduardo Cunha (à direita) discute com os petistas Genoino, Chinaglia e Vaccareza na longa votação da MP dos Portos: Governo não quer tripudiar da derrota do peemedebista
Foto: O Globo / Ailton de Freitas/14-5-2013
Eduardo Cunha (à direita) discute com os petistas Genoino, Chinaglia e Vaccareza na longa votação da MP dos Portos: Governo não quer tripudiar da derrota do peemedebista O Globo / Ailton de Freitas/14-5-2013
BRASÍLIA - Dias seguidos de duras batalhas entre o Congresso e o Palácio do Planalto deram ao governo uma importante vitória, com a aprovação da MP dos Portos, mas deixaram expostas as fissuras na relação do PT com o principal partido da base aliada, o PMDB. As discussões durante a madrugada de quinta-feira, quando deputados petistas chegaram a afirmar que o presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), estaria contribuindo com a oposição, são resultado de um processo de desgaste que começou quando Dilma Rousseff tomou posse e que chega agora a um momento crítico. Parlamentares da base aliada dizem que a crise vem crescendo à medida que as eleições de 2014 se aproximam, mas ninguém hoje com poder no PMDB cogita abandonar a chapa presidencial em 2014.


Mas a grande dúvida é se os deputados federais colocarão de fato o time em campo para ajudar a reeleição de Dilma. E quanto de trabalho ainda darão ao governo nas próximas votações importantes da Câmara. O motivo principal de queixa é um só: os deputados peemedebistas temem que a falta de apoio do governo prejudique suas candidaturas à reeleição. Ou seja, trata-se de uma questão de sobrevivência. Foi por isso que se fez muito barulho nas votações das madrugadas.
Queixas contra políticas públicas diretas
A reclamação não é mais apenas pelo fato de o governo não liberar as emendas parlamentares aprovadas no Orçamento da União que os deputados destinam às bases eleitorais. O novo foco de crise é a decisão do Planalto de estabelecer políticas públicas diretas com os municípios, que, dispensam a intermediação dos parlamentares.
Exemplos citados por deputados são as entregas de ônibus escolares e máquinas agrícolas a prefeituras do interior feitas pela própria Dilma. Usualmente, eles usam parte de suas emendas para destinar o maquinário para suas cidades, e, agora, acusam o governo de fazer a destinação e, pior, de só avisar aos políticos do PT para que eles faturem politicamente. Após o PMDB perder 15% de suas prefeituras nas eleições do ano passado, o temor é que o mesmo aconteça com a bancada federal:
— Há uma preocupação de que 2012 seja um trailer do filme que se aproxima em 2014. Só que em 2014 o que está em jogo é o futuro de cada um. Se cair de 80 para 60 (deputados), a preocupação é quem serão esses 20. O projeto de poder do PT é hegemônico, e ele tem mecanismos como informação, verba e ministérios que o PMDB não tem. Cabe à presidente bater na mesa e dizer que quem vai sofrer é a família toda — cobra o deputado Lúcio Vieira Lima (PMDB-BA).
O cenário no Senado é menos dramático. Como os principais senadores peemedebistas comandam nacos importantes do governo e apenas um terço dos parlamentares terá de disputar eleição no próximo ano, as reclamações são menores. Ex-líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR), avalia:
— A base do governo sai unida aqui no Senado. A coordenação política do Planalto precisa trabalhar a base da Câmara, é importante fortalecer a união.
O senador Humberto Costa (PT-PE), segue a mesma linha:
— A coisa foi na Câmara mesmo. Não identifico nenhum problema no Senado com o PMDB. Pelo contrário, o PMDB no Senado até entrou em conflito com o partido na Câmara por causa das dificuldades que estava colocando para votar a MP. Agora, precisa de um tempinho para deixar a poeira baixar e ter um pouco de conversa, para que isso não tenha maior repercussão.
Sem retaliações a Eduardo Cunha
Articuladores no Planalto trabalham para curar as feridas da recente guerra e a própria presidente Dilma pôs a mão na massa para executar a tarefa. A estratégia é afagar o partido, prestigiando o vice-presidente, Michel Temer, e os presidentes da Câmara e do Senado, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN) e Renan Calheiros (PMDB-AL), no papel de interlocutores privilegiados do governo.
É uma promessa de tentar reduzir uma das principais queixas dos aliados, que só cresceu desde a posse de Dilma: a de que os políticos não são ouvidos pelo Planalto e de que falta habilidade na articulação política. Com a proximidade das eleições de 2014 e matérias importantes a serem votadas no Congresso até lá — como o código da mineração, reformas no ICMS e no PIS-Cofins —, a avaliação no governo é de que não há mais espaço para estremecimentos na relação com o PMDB.
Nesse raciocínio, o líder do PMDB, Eduardo Cunha (RJ), que comandou o movimento rebelde na Câmara durante a votação da MP dos Portos, deverá ser poupado de retaliações. O Planalto respirou aliviado na noite de quinta-feira, após a aprovação da medida, pela avaliação de que, se o governo tivesse perdido, Cunha teria se tornado a figura mais importante do Congresso, e aumentaria exponencialmente a fatura a ser cobrada em cada votação.
Mas há uma preocupação em não transformar o deputado em mártir. Por isso, em reunião na mesma noite, Dilma determinou a ministros e auxiliares que a página fosse virada, e proibiu o discurso de que Cunha seria retaliado com perda de cargos que apadrinhou em estatais. Foi um recado para tentar distensionar a relação com o líder do PMDB na Câmara. Nesta reunião, um ministro resumiu: “Nós sabemos que ganhamos e ele sabe que perdeu; não podemos tripudiar”.
No PT, o clima é de desconfiança crescente em relação ao mais importante aliado. Durante a votação de quinta-feira, chegou-se a ouvir gritos de “Fora PMDB” no plenário da Câmara, mesmo com o esforço dos dois presidentes do Congresso em entregar a mercadoria para o Planalto.
Mas, em evento nesta sexta-feira em que o PT comemorou os 10 anos de governo, o presidente do partido, Rui Falcão, minimizou as discussões entre os partidos:
— Quando há votações muito polêmicas, que se estendem pela noite, sempre há tensão. A gente não faz política por uma frase mais alta ou por uma fala fora do contexto.
Depois que acionou o trator governista e aprovou a MP em poucas horas no Senado, Renan cresceu na cotação do Planalto. Nesta sexta-feira, ele dava o tom dos discursos dos dirigentes do partido:
— O importante foi o resultado e não podemos generalizar o clima de embate, porque são correntes dentro dos dois partidos.

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