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MP pedirá fim de xadrez em delegacia

SARA OLIVEIRA
saraoliveira@oestadoce.com.br

Foram, pelo menos, três tentativas de fuga de Distritos Policiais (DP) de Fortaleza e Região Metropolitana nos últimos três dias. Hoje, 906 presos ocupam os xadrezes das delegacias, quantitativo que deverá seguir, até julho, para a recém-inaugurada Casa de Privação Provisória de Liberdade (CPPL) IV, cumprindo determinação do Ministério Público Estadual (MPE).
Aliada à transferência, o MPE pedirá a destruição de todas as carceragens existentes, tentando fazer valer a Lei de Execução Penal de 1984 que, no Ceará, nunca foi cumprida.
A Lei, assim como a Constituição Federal, prevê que a permanência do preso aconteça em estabelecimentos do sistema penal especializados, sob a guarda dos órgãos de Justiça, e não da Polícia.

“Enquanto os policiais vigiam os detentos dentro da delegacia, do lado de fora, não há contingente suficiente para reprimir os crimes”, ressaltou a promotora de Justiça, Fernanda Marinho. Ontem, uma audiência pública iniciou a sensibilização sobre a necessidade de esvaziamento e destruição de celas nos DPs, entretanto, o debate não contou com a participação de representantes da Secretaria de Justiça e Cidadania (Sejus).
De acordo com o presidente da Associação de Delegados da Polícia Civil (Adepol), Milton Castelo, as delegacias não devem custodiar detentos, principalmente por causa do número reduzido de policiais.
“O ideal seria 10 inspetores para cada DP e, hoje, mesmo após o concurso [que admitiu 624 profissionais], a proporção só passou de um para três”, explicou Milton. Junto ao contingente insuficiente, somam-se condições desumanas de sobrevivência, descritas através de relatório da Defensoria Pública do Ceará.
PRESOS SEM DIREITOS
Os presos não têm banho de sol, dormem em cima de toalhas ou lençóis, apenas almoço e jantar são fornecidos pelo Estado, que também não presta qualquer assistência à saúde ou no âmbito social. Estas são algumas das condições identificadas, que violam os direitos à vida, à integração física, psíquica e moral, além do princípio da razoável duração do processo. O relatório da Defensoria foi elaborado, em junho do ano passado, e recomendou ao Estado a realizar, de forma urgente, ações que diminuíssem a violação de direitos.

Quase dez meses se passaram e, segundo a promotora Fernanda Marinho, os 906 presos nas delegacias ainda dormem sem colchões, usando garrafas plásticas como travesseiros, têm doenças como tuberculose e pneumonia sem tratamento, e convivem com fortes odores e condições “imundas”. “As celas têm paredes frágeis e as grades são trancadas com cadeados que podem ser, facilmente, danificados”, acrescentou a promotora. Sem estrutura, fugas de DPs tornam-se recorrentes: 10 presos deixaram o 9º DP, em duas fugas, durante o fim de semana; ontem, uma tentativa foi registrada no 13º DP.
EXEMPLOS QUE DÃO CERTO
Seis estados brasileiros já exterminaram os xadrezes das delegacias (RS, RN, GO, DF, MT, PE). Durante a audiência pública, representantes de sindicatos da Polícia Civil de do RS, DF e PE expuseram os benefícios da iniciativa, que poderá ser concretizada no Ceará, estado que possui o menor contingente de policiais civis do País. “O desvio de função ocasionará, irremediavelmente, a falta de segurança pública. Sem investigação, o juiz acaba sem subsídio para colocar o preso no presídio”, avaliou a presidente do Sindicato dos Policiais Civis do Ceará (Sinpoce).

Em Brasília, desde 2001, não existem presos em delegacias. Conforme o presidente do Sindicato da Polícia Civil do DF, Ciro de Freitas, apenas uma carceragem está ativa, por onde passam todas as prisões. “Se for medida cautelar, o preso fica lá, mas se for autuado em flagrante, já segue para a penitenciária”, explicou. No Estado, existem 6.500 vagas em penitenciárias, com população carcerária de 11 mil.
Um dos questionamentos de advogados e policiais presentes à audiência era sobre a permanência de presos nos xadrezes para procedimentos de acareação e reconhecimento.
O policial Edgar Guilherme, do RS, explicou que, nestes casos, a Polícia Civil deve ir até o presídio e levar o preso à delegacia, retornando no final do dia. “É um paradigma que precisa ser exterminado: o policial sendo agente penitenciário enquanto deveria estar descobrindo crimes”, afirmou.

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