Coisas do Mensalão

O ministro, o jabuti e o PMDB

Por Pedro Abramovay*, especial para o blog de Ancelmo Gois

Uma das primeiras coisas que se aprende em Brasília é que jabuti não sobe em árvore. Se ele está em cima da árvore é porque alguém o colocou lá. A metáfora é utilizada para que sempre que algo estranho acontece fiquemos atentos sobre quem está por trás disso.
Logo em seguida se aprende que, na dúvida, foi o PMDB que colocou o jabuti na árvore.
A indicação do Ministro Teori Zavascki, jurista profundamente respeitado por seu vasto conhecimento e por não ter qualquer mácula em sua biografia, teria tudo para ser uma das mais consensuais já feitas para o STF.
Não tem sido o caso. É hora da caça aos jabutis.
O primeiro jabuti apareceu na rapidez com que a indicação foi feita. As indicações para o STF ultimamente estavam sendo feitas em meses. O ministro Teori foi indicado em uma semana.
A explicação mais convincente que apareceu na mídia foi a de que a presidenta quis fugir da pressão que se instalaria para que ela indicasse alguém que beneficiasse os réus do mensalão. Quanto mais ela demorasse, mais tempo para especulações, negociações, vazamentos na imprensa. Ela foi rápida, fez uma indicação acima de qualquer suspeita e que a afastou da acusação de barganhar com uma indicação para o Supremo.
Mas os jabutis continuaram querendo dar as caras. Horas depois do Senado receber a indicação, o senador Renan Calheiros apresentou o parecer aprovando a candidatura. Os senadores pedem vista do parecer. Mas a sabatina é marcada para pouco tempo depois. Durante o período de recesso eleitoral. Por que a pressa?
A pressa aumentou as especulações. Todos procurando quem levou o jabuti até o topo da árvore. Querem que o ministro vote no mensalão?
O ministro não responde se vota ou não. Ministros do STF admitem a possibilidade dele votar.
Pronto. Uma parte expressiva dos comentaristas políticos já afirma com segurança: Dilma indicou Teori para que ele absolva os réus do mensalão. Ou talvez para que ele peça vistas do processo e atrase tudo. Jogue a discussão para depois das eleições.
Chega a hora da sabatina. Agora já há uma comunidade inteira de jabutis sobre a árvore.
O senador Aloysio Nunes (PSDB-SP) apresenta um requerimento para adiar a sabatina. Diz que a pressa não está à altura da trajetória do ministro. O Presidente da comissão, Eunício Oliveira (PDBM-CE) – olha o PMDB aí... – é duro como poucas vezes se viu antes. Não se pode adiar. O senador Pedro Taques tenta discutir o requerimento. Não pode. Oliveira diz que o regimento autoriza apenas que líderes de bloco discutam essa matéria. Taques é líder de um partido. Esse rigor com o regimento só é comum quando se quer adotar estratégia de rolo compressor.
O debate esquenta. A oposição insiste. E aqui, pra quem cultiva jabutis, algo interessante acontece. O líder do governo não está presente na sessão. Pelo menos não se manifestou. O líder do PT tampouco. As vozes de defesa da pressa (travestida em defesa do ministro Teori) são todas do PMDB.
A sabatina começa. A primeira pergunta, claro, é se o ministro vai ou não votar no mensalão.
O ministro Teori é radicado no Rio Grande do Sul. Mas tenta dar resposta de mineiro. O resultado só beneficia os jabutis. Ele diz que não pode dizer se vota ou não. A lei não permite que ele comente processos em curso. Mas que pode dizer que o regimento do STF só admite que ele vote caso se sinta habilitado. E que o pedido de vista é autorizado para o juiz que não se sinta habilitado.
Com isso tenta desmontar a tese de que vai pedir vista para atrasar o processo.
E ele continua. O STF tem hoje dez ministros. O empate favorece o réu. Assim, se estiver empatado em 5 a 5 um novo ministro pode apenas prejudicar os réus. Se estiver 6 a 4 o novo ministro não alterará o resultado.
Com isso ele mostra que o voto dele no processo não poderia beneficiar os réus.
Bom, então as explicações dos apressados comentadores políticos não servem?
Para alegria dos jabutis e tristeza da árvore. A história não para por aqui. A sabatina continua por mais algum tempo. Apenas um quinto dos senadores inscritos já haviam perguntado quando, em função do início da sessão plenária, a sessão é interrompida. É uma regra regimental.
O governo é firme: a prioridade é votar o código florestal. Que se remarque a sabatina se for preciso.
Após uma reunião entre Sarney, Renan e Eunício (três caciques peemedebistas) decide-se: a sabatina será adiada para outubro, após as eleições.
Então por que o desgaste? Se todos sabiam que a sessão seria interrompida, por que submeter um ministro da envergadura de Zavascki a teorias conspiratórias que claramente o incomodaram profundamente?
Bom, são tantos jabutis que fica difícil responder a pergunta. Mas as lições de Brasília continuam atuais. Os jabutis não chegaram na árvore sozinho. E o PMDB tem algo a ver com isso.
*Professor da FGV Direito Rio

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