Se forem condenados no STF, os 38 réus do mensalão ainda terão direito a dois ‘recursos’


Convencionou-se dizer que as decisões proferidas em julgamentos criminais feitos no STF não são passíveis de recurso. Chegou-se mesmo a especular que, na hipótese de condenação, os 38 réus do mensalão poderiam ser recolhidos imediatamente à cadeia. Essa ideia é falsa. Coube ao ministro Celso de Mello desmistificá-la.
Na sessão desta quinta-feira (2), o decano do Supremo esmiuçou o rito de apreciação da ação penal ao votar contra o desmembramento do processo, pedido pelo advogado Márcio Thomaz Bastos e rejeitado por 9 votos a 2. Celso de Mello explicou que os réus têm o direito de lançar mão de dois recursos.
Num, o “embargo de declaração”, os advogados dos réus podem requerer do STF o esclarecimento de eventuais dúvidas ou contradições expostas no acórdão, texto que transcreve o resultado do julgamento.
Noutro, chamado tecnicamente de “embargo infringente”, um réu condenado pode solicitar a revisão do julgamento. Mais relevante do que o primeiro, esse tipo de recurso, quando admitido, força o tribunal a reanalisar os autos, revisitando as provas.
De acordo com a explicação de Celso de Mello, o mais antigo magistrado da Corte, os embargos infringentes estão previstos no artigo 333, inciso primeiro, do regimento interno do Supremo. Contempla regras que favorecem os réus.
Uma vez admitido o recurso, opera-se a troca automática do relator e do revisor do processo. Quer dizer: Joaquim Barbosa, relator da ação penal do mensalão, e seu colega Ricardo Lewandowski, revisor dos autos, seriam substituídos por outra dupla. Por quê? “Para permitir uma nova visão sobre o tema”, esclareceu Celso de Mello.
Mais: o recurso não pode ser utilizado pela Procuradoria da República para, por exemplo, pedir a elevação da pena imposta aos réus. “Interdita-se ao Ministério Público a possibilidade de propor esse recurso. É exclusivo do réu, da defesa”, disse Celso de Mello.
Para que um “embargo infringente” seja admitido, detalhou o ministro, é preciso que o “julgamento condenatório seja majoritário”. Signigica dizer que, apenas as condenações que resultarem de decisões unânimes poderão ser consideradas como jogo jogado, insuscetíveis de questionamento.
Com esses argumentos, Celso de Mello se contrapôs ao pedido de Thomaz Bastos, que havia sido deferido pelo revisor Ricardo Lewandowski, com a solitária adesão de Marco Aurélio Mello. Defensor de José Roberto Salgado, um ex-diretor do Banco Rural, o ministro da Justiça do governo Lula alegou que o STF não tem competência para julgar o seu cliente.
Sustentou que, sem mandato eletivo, o ex-executivo do Rural não dispõe da chamada prerrogativa de foro. Assim, teria de ser julgado por um magistrado de primeiro grau, não pelo Supremo. Algo que lhe facultaria o direito de recorrer às instâncias judiciais subsequentes.
Na versão de Thomaz Bastos, a manutenção no STF do julgamento dos sem-mandato, além de violar o princípio do “juiz natural”, sonega a eventuais condenados o “direito ao duplo grau de jurisdição.” Noutras palavras, haveria cerceamento da defesa.
O problema é que a questão esgrimida por Thomaz Bastos já havia sido analisada pelo STF. Levada ao plenário em três oportunidades, a pedido do réu Marcos Valério, foi rejeitada. Primeiro, por maioria de votos. Depois, por unanimidade. Daí a reiteração do indeferimento, dessa vez por 9 votos a 2.
Thomaz Bastos ainda tentou argumentar que a questão do desmenbramento ainda não fora analisada pelo supremo sob um prisma constitucional. Disse que as decisões anteriores haviam sido tomadas levando-se em conta apenas a legislação infraconstitucional. Foi rebatido por vários ministros.
No caso do mensalão, prevaleceu o entendimento segundo o qual os réus “comuns” devem ser julgados junto com os acusados detentores de mandato porque os crimes de que são acusados –formação de quadrilha, por exemplo— têm conexão entre si. Muitos são apontados como co-autores dos delitos.
Se a tese de Thomaz Bastos tivesse prevalecido, seriam beneficiados com o desmembramento nada menos que 36 dos 38 réus. Entre eles os integrantes daquilo que a Procuradoria chamou de “núcelo central” da quadrilha: o “chefe” José Dirceu e seus “comandados” José Genoino e Delúbio Soares.
Além de refutar o lero-lero do cerceamento de defesa e de iluminar as possibilidades de recurso, Celso de Mello fez uma declaração que soou como prenúncio de julgamento técnico: “O Supremo, órgão de cúpula do Judiciário, máximo guardião e intérprete da Constituição, garantirá de modo pleno às partes desse processo, Ministério Público e réus, o direito a um julgamento justo, imparcial, impessoal, isento e independente.”
Tá no josias

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