Ataque e contra-ataque
Ely Aguiar, deputado estadual foi ao meio fio e, do alto da tribuna
da Assembleia, disse que o procurador da Casa, Reno Ximenes, “pisou na bola” ao
dizer que o projeto de Ficha Limpa do colega, lá deles, Heitor Férrer, era
equivocado. A imprensa leu assim:
“O deputado Ely Aguiar (PSDC) ocupou a tribuna da Assembleia
Legislativa, nesta sexta-feira, e criticou o parecer do procurador
jurídico da Casa, Reno Ximenes, contrário à emenda proposta pelo deputado
Heitor Férrer (PDT) à Constituição Estadual. Heitor defende a aplicação da Lei
da Ficha Limpa na escolha de ocupantes de cargos do Governo do Estado.
Segundo Ely Aguiar, o procurador disse à
imprensa local que a Ficha Limpa foi instituída apenas no plano da legislação
eleitoral.
“O Departamento Jurídico desta Casa pisou na bola e precisa, literalmente,
de orientação jurídica para rever este parecer. Foi um equívoco gritante, uma
posição equivocada”, disparou o parlamentar.
Segundo Ely Aguiar, os parlamentares são livres para decidir sobre
a viabilidade da emenda sugerida pelo pedetista. Ele destacou que estados como
o Maranhão e Pernambuco já aplicam o critério da Ficha Limpa na escolha de seus
gestores.
Eliane Novais (PSB) disse concordar com Ely Aguiar. “Queremos que a
Ficha Limpa seja adotada da forma mais clara. Solicito à Mesa Diretora uma
reflexão que acompanhe o anseio popular nacional de moralização da política e
ampliação da Ficha Limpa”, reforçou.
O Procurador Reno Ximenes foi à
réplica. Distribuiu nota à imprensa e com elegância tirou Ely Aguiar e seus
argumentos de prumo. Veja:
Gostaria de prestar os seguintes
esclarecimentos a respeito da polêmica criada em torno da Ficha Limpa no
Estado:
1. Parecer jurídico é um exercício
profissional que goza de imunidade profissional baseado no art. 133 da
Constituição Federal, servindo apenas como orientação jurídica às condutas
jurisdicionais, executivas ou legislativas, como é o caso concreto,
podendo, serem discricionariamente ou politicamente despercebidos pelos
gestores ou mandatários. Acerca da manutenção ou retratação de uma
convicção jurídica, cabe exclusivamente, ao parecerista ou o responsável
pelo ó rgão jurídico a sua condução, expedição ou retratação, não
ficando suscetível ao tempo e espaço de ritos, principalmente, quando
ocorre um fato novo, como foi a decisão do STF, emitida após o
parecer exarado por mim e antes da decisão do plenário da assembléia.
Parecer que mantenho pelos seguintes argumentos principais:
2. A matéria do “ficha limpa” para os
Estados não pode ser copiada automaticamente, nos termos da decisão do
STF. Embora não tenha efeito vinculante aos Estados, o que STF decidiu é
afeto apenas aos casos de elegibilidade de candidaturas em matéria de Direito
Eleitoral. Casos de investira e exercício de servidores públicos são da
área do Direito Administrativo, matéria diversa da tratada no Supremo.
3. Há controvérsias do teor da matéria
e a Constituição Federal veda aos Estados legislarem sobre Direito Penal e
Processual, competência privativa da União.
4. Mesmo que sobrevivesse algum
argumento de cunho moral, o projeto está contaminado de vício de
iniciativa, pois projetos de lei que tratem de gestão administrativa e
servidores públicos, o próprio Supremo Tribunal Federal sustenta que é de
competência privativa do Poder Executivo, cabendo a ele exclusivamente a
faculdade de deflagrar o processo legislativo.
5. A decisão do STF é inconstitucional,
como outras recentes que tem retirado direitos constitucionais pétreos,
pois a Constituição Federal foi escrita por uma assembleia nacional
constituinte eleita exclusivamente para tal fim, não cabendo ao STF
poderes para revogar os direitos historicamente consagrados nela
consignados, nem mesmo através de emenda constitucional, em razão da
vedação do Art. 60.
6. As críticas políticas ao parecer
fazem parte do exercício justo do cotidiano parlamentar ou da sociedade, o
que não cabe a mim replicar, apenas quando elas surgirem com algum teor,
substancialmente, jurídico.
7. A aprovação por outros Estados ou
Municípios são decisões políticas, não necessariamente jurídicas ou
constitucionais, movidas pelo torpor do moralismo, pois ainda não
foram aferidas a sua constitucionalidade, o que necessariamente, apenas
o futuro dirá.
8. Só falta o populismo jurídico
aparecer agora com uma proposta para extinguir com o Habeas Corpus, sob o
pretexto que esteja trazendo à liberdade, indevidamente, muitas pessoas.
9. Não se pode fazer reformas políticas
com decisões judiciais baseadas em retóricas jurídicas. Para a probidade
administrativa e eleitoral o país já possui inúmeras leis que são
cotidianamente descumpridas, suspensas ou despercebidas. O que falta é
postura e força política no combate à impunidade, principalmente no
Brasil, em face do Direito
Eleitoral ser eminentemente
jurisprudencial, portanto, vulnerável e inseguro juridicamente.
10. Sou solidário à indignação social
em face de muitos desmandos públicos, mas, garanto que não é
construindo falsos horizontes jurídicos baseado no moralismo messiânico
que resolveremos. Moralismo não é moralidade. Moralismo é apenas um
bâlsamo que atenua a dor e o sintoma iludindo a doença, no caso, aquela
que a sociedade brasileira hoje sofre, a desonestidade pública e a canalhice
populista, fazendo retardar as atitudes efetivamente necessárias para uma
reforma política inadiável.
*
Reno Ximens
Procurador
Jurídico do Poder Legislativo do Ceará.
Penso eu – A visão de Reno Xemenes,
no item 10 de seu texto é de uma sabedoria brilhante e meridiana. Ouso repetir:
Moralismo não é moralidade. Moralismo é apenas um bâlsamo
que atenua a dor e o sintoma iludindo a doença, no caso, aquela que a
sociedade brasileira hoje sofre, a desonestidade pública e
a canalhice populista, fazendo retardar as atitudes
efetivamente necessárias para uma reforma política inadiável.
Esse menino não perdeu as aulas do Padre Osvaldo
Chaves. Uma bendita herança da nossa educação sobralense.
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