Peritos - Protesto contra condições de trabalho


Por Sara Oliveira
saraoliveira@oestadoce.com.br

Fuga de presos, atraso em processos, laudos periciais sob dúvida, impunidade e insegurança. Estes são alguns dos fatores que insistem em fazer parte das deficiências do serviço de segurança pública prestado aos cidadãos cearenses. Prova do problema que aflige a tranquilidade da população pôde ser constatada durante manifestação dos servidores da Perícia Forense do Estado do Ceará (Pefoce) na avenida Beira Mar, ontem. A categoria está em greve desde o dia 2 de julho e reivindica melhores salários e condições de trabalho, com apenas 30% do efetivo em atividade.

A simulação de um assassinato e do trabalho realizado pelos peritos foi a forma encontrada pela categoria para informar a população sobre as reivindicações. A razão para a realidade precária do serviço que ajuda a elucidar crimes pode ser justificada pela precariedade estrutural e de pessoal no atendimento de demandas. Homicídios, suicídios, incêndios, acidente de trânsito com vítimas fatais e afogamento são algumas das ocorrências que exigem a presença destes profissionais. Somente dois peritos ficam de plantão para estes eventos. Em greve, apenas um.

Em 2010, foram cerca de 5.500 ocorrências que foram atendidas por apenas 14 profissionais, responsáveis pela demanda de 30 municípios, incluindo Fortaleza. Em todo o Ceará, só existem 208 peritos e auxiliares de peritos. Esta disparidade entre necessidade e capacidade faz com que o tempo de espera, tanto para ocorrências quanto para laudos técnicos, ultrapasse o indicado para que haja eficiência e justiça. “Todo processo e inquérito criminal precisam de uma prova científica. Só quem a fornece é o perito”, frisou a perita em áudio e vítima, Ana Márcia Araújo Martins.

DEMORA DA JUSTIÇA
Entre os detalhes descritos durante a simulação de ontem, a importância de equipamentos como luminol (substância que revela vestígios de sangue), máquina fotográfica de qualidade e computadores com grande capacidade de processamento. “Desde a criação do Pefoce, em 2008, ouvimos promessas do Governo do Estado sobre investimentos de profissionais e material. Mas isso nunca aconteceu”, denuncia Ana.

Um exemplo prático do descaso com as elucidações de crime que são provedoras de direito à sociedade é citada pela perita. “Estou trabalhando em um caso de estupro à criança, onde há uma gravação, momentos depois do crime, da garota contando tudo aos pais, indicando o acusado. Como terei de fazer uma cirurgia contra um câncer, vou me ausentar. Não há ninguém para ficar no meu lugar”, contou.
Apenas Ana, entre toda a equipe da Pefoce, é capaz de analisar a gravação de forma científica, a fim de constatar se é uma montagem ou não.
Fora do trabalho durante alguns meses, o crime ficará “perdido”, sem culpado, provas ou justiça. As reivindicações dos peritos, que incluem equiparação salarial a outros estados, redução das distorções salariais e condições dignas de trabalho, foram entregues ao Governo do Estado em 14 de fevereiro. Ontem, de acordo com informações da Secretaria de Segurança Pública e Defesa Social (SSPDS), as propostas ainda estão em análise.

“30% DE POUCO É NADA”
“Se não houve um diálogo rápido entre o poder público e a categoria, a tendência é que a situação, que já é ruim, piore ainda mais”, ponderou o presidente da Comissão de Segurança Pública da Organização dos Advogados do Brasil (OAB/CE), César Bertosi. Ele destacou que a perícia cearense é precária na prestação de serviço há algum tempo e que, com a greve, “30% do efetivo trabalhando é nada”.

A junção das precariedades do serviço pericial provoca, segundo o advogado, um retardamento ainda maior do andamento dos processos. “Além disso, sem qualificação de serviço, os advogados envolvidos em processos tendem a contestar laudos periciais, apontando problemas que são reais”, avaliou. Para César, o que não se pode é alimentar uma “guerra” judicial entre categoria e Governo. “Isso tudo atinge a sociedade e a segurança”, destacou.

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