Primeiro transplante de pulmão no CE


Por Sara Oliveira
saraoliveira@oestadoce.com.br
“O homem já está até conversando”. Ele é Francisco Eudes Aguiar, 43, que desde ontem respira com um novo pulmão. Foi o primeiro transplante do órgão nas regiões Nordeste e Norte e aconteceu no Hospital de Messejana. Um avanço incomensurável para a medicina e a possibilidade de uma nova vida para um homem, que já rezava o Pai Nosso um dia depois da cirurgia. Serão novos suspiros, graças à doação. Após anos dependendo de um balão de oxigênio, Eudes agora já respira sem aparelhos.

Os problemas cardíacos e respiratórios começaram em 2002. De lá para cá, foram muitos exames e prazos pré-determinados de vida. “Em um dos exames que o Eudes fez, o pulmão dele parecia uma toalha de renda, cheio de buracos. Já teve médico que deu apenas dois meses de vida a ele”, contou Salete Aguiar Pontes, irmã de Eudes. Um enfisema pulmonar em fase avançada fez com que seu pulmão esquerdo ficasse comprometido, com apenas 33,9% da função, enquanto o pulmão direito tinha 68% da capacidade.

Salete abraçava o coordenador da Equipe de Transplante de Pulmão e médico responsável pela cirurgia, Antero Gomes Neto, e dizia: “Doutor, já gastei R$ 50 de créditos do telefone para avisar minha família que a operação foi um sucesso”. A “peleja” em busca de uma nova chance mobilizou toda a família de Eudes. Naturais de Sobral, a vinda para a Capital foi difícil. Mas a recompensa, nem a irmã, que disse ter vivido ao lado do irmão nos últimos anos, pode dimensionar.

Em outubro de 2010 teve início a espera por um pulmão. “A gente precisou alugar um apartamento aqui perto, porque quando surgisse um órgão, tínhamos de correr”, contou Salete. O dia chegara, e marcou o atendimento aos cearenses com graves problemas respiratórios. Foi a concretização da opção à vida, sem discriminação de gênero, poder aquisitivo ou classe social.
A preparação da equipe médica, investimentos em equipamentos e medicações e, acima de tudo, a consciência da família do doador, que era um jovem de 39 anos que faleceu em um acidente de moto. Esses foram as “ferramentas” para que Eudes continuasse executando a mais natural sensação do ser, a respiração.

PRÉ E PÓS-OPERATÓRIO
A satisfação do cirurgião Antero Gomes escondia a noite não dormida. Foi ele quem trouxe a notícia sobre o estado pós-operatório do transplantado. A cirurgia abriu caminhos para Eudes e marcou a equipe médica responsável por transplantes. “Estamos há quatro anos nos preparando para este transplante, recebemos, inclusive, credenciamento do Ministério da Saúde”, observou o cirurgião.

A espera por um doador já contabilizava três meses. De acordo com Antero, de cada 10 doadores, apenas cinco têm o pulmão apto para doação. “Nos hospitais de urgência, será preciso melhorar a manutenção de possíveis pulmões para doação. O futuro doador geralmente é exposto em corredores contaminados, o que torna o órgão inútil para a doação”, explicou. O cirurgião acrescentou que o pulmão, por ser um órgão que mantém contato com o exterior do corpo, está sempre exposto a infecções.

Eudes está “dentro da evolução esperada”. Durante as primeiras 48 horas após o transplante, pode ocorrer uma lesão pulmonar de reperfusão, que acontece quando o sangue do órgão doado entra em contato com o sangue do transplantado. “Mas o Eudes está indo muito bem. Só em ele não estar mais ‘entubado’, já diminui riscos de infecção, o que é um ótimo resultado”, observou Antero.

DOANDO
A preparação para que Eudes recebesse o pulmão começou com um exame de Raio –X no órgão, para constatar a existência de alguma infecção. A gasometria arterial foi o exame seguinte, que avalia a funcionalidade do órgão e, por fim, faz-se a Broncoscopia, que examina com detalhes a árvore traqueobrônquica.

O pulmão que hoje inspira e expira no peito de Eudes veio de um paciente atendido no Instituto Doutro José Frota (IJF) Sua irmã Salete agradeceu, com olhos marejados e aperto na mão da repórter, o ato de amor. “Ele sofreu muito nos hospitais e hoje, com um pulmão novo, posso dizer que essa pessoa levantou alguém que já estava quase morto. É aquela história de doar o que não se precisa mais”, exemplificou Salete.

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