Biblioteca Nacional completa 200 anos de portas abertas ao público


RIO - Intelectuais como Benjamin Constant, João Caetano e Manoel Antônio de Almeida tiveram presença registrada (e frequente) na Biblioteca Nacional, cuja abertura para o público completou ontem 200 anos. A instituição, fundada em 1810, teve, em seus primeiros meses, acesso franqueado apenas à Família Real. O privilégio caiu por ordem do então príncipe-regente D. João VI, que dispôs as 60 mil peças do acervo a pesquisadores da Corte - desde que autorizados por ele. A trajetória dos frequentadores entre as estantes será lembrada, na semana que vem, em uma mostra no saguão da biblioteca.
FOTOS: Os 200 anos da Biblioteca Nacional em imagens
Além dos ilustres, a instituição contava com uma penca de indesejados - e não fazia questão de esconder seus nomes. Avisos como "prohibida a entrada de Aarão Ackermann e David Vieira, por haverem retalhado e subtrahido paginas de livros que lhes foram dados para consulta (...)" já foram comuns na entrada da biblioteca.
- Volta e meia acontece de folhearmos uma obra e ver uma janelinha no meio da página. Era alguma coisa, provavelmente uma gravura, retirada com canivete - conta Mônica Rizzo, diretora do Centro de Referência e Difusão da Biblioteca Nacional.
Os prefeitos, como eram chamados os administradores da coleção, precisavam lidar com outras tentações. Livros (e até jornais) eróticos deviam ser alojados no inferno, um espaço cuja consulta era proibida. A seção não existe mais, embora obras condenadas judicialmente - como a biografia não-autorizada "Roberto Carlos em detalhes", de Paulo Cesar de Araújo - continuem vetadas aos leitores. E, durante o regime militar, fichas como as de Karl Marx teriam "desaparecido" do acervo.
- D. João fazia aniversário no dia 13 de maio, e era praxe ele aproveitar a data para assinar medidas importantes. Em 1811, uma delas foi a abertura da biblioteca para pesquisadores autorizados - explica Mônica. - Fazia-se um pedido por escrito. Esta formalidade caiu apenas três anos depois, quando o acesso foi liberado para toda a população.
Não que a biblioteca tenha sido invadida por leitores ávidos. Afinal, a cidade contava com apenas 60 mil pessoas, e o número de alfabetizados era um mistério.
- Cerca de 90% sabiam assinar os seus nomes, o que não quer dizer que todos conseguiam ler os livros - ressalta o historiador Nireu Cavalcanti. - Mas, ainda assim, a abertura da biblioteca à população foi um presente para a cidade. Tratava-se de uma das coleções mais respeitadas da Europa.
Pela sua formação ligeira, em apenas meio século, a coleção tinha de tudo um pouco, embora seus destaques fossem mapas e informações sobre as colônias. Estas, aliás, ficavam devidamente enclausuradas $uma seção restrita, junto a outros documentos de Estado.
A realeza não ia à biblioteca, mas mandava os criados buscarem o que lhes interessasse. D. Pedro II, notório intelectual, era o que mais fazia uso do serviço. Também foi ele, aliás, o maior doador individual da história da instituição. Boa parte de seu acervo foi para lá quando ele partiu para o exílio europeu, após a proclamação da República. Uma fotografia de sua coleção, retratando sua mulher, a imperatriz Teresa Cristina, está entre os dez documentos mais consultados da World Digital Library, site $reúne documentos de diversas bibliotecas do mundo.
A entrada da instituição na associação mundial, assim como o seu próprio site, são amostras de que a Biblioteca Nacional não briga com o futuro. A digitalização do acervo foi iniciada em 1982 e não termina tão cedo - afinal, 100 mil novos títulos dão entrada na instituição anualmente, e as fichas manuscritas do século XIX ainda não foram aposentadas.

Penso eu : Um dia, arrumava a mala em Buenos Aires, era uma quinta feira pela manhã, quando o telefone do apartamento do hotel toca. Era meu diretor, Edilmar Norões, eis que à época era reporter especial e editor do Bom Dia Ceará na TV Verdes Mares.Estava encerrando uma viagem para cobrir o Mercosul, ao lado de Sarney,Presidente. Perguntou de disponibilidade de tempo, roupa e tal. Tinha grana sobrando, tinha todo o tempo do mundo no fim de semana, tinha uns panos até que simpáticos pra vestir. Intrigado, perguntei pra que era. Sempre zeloso, Edilmar disse que naquele ano, pela segunda vez, eu faria o material da Sereia de Ouro, dodói dos Queiroz. Sim, e daí? Fique no Rio. Procure pelo Romulo Siqueira na Rádio Tamoio e ele passará tudo pra voce. E se precisar de qualquer coisa, fale com ele.
Fiquei entusiasmado com os personagens: Florinda Bulcão, Barrica, Dom Raimundo Damasceno e...Djacir Menezes. Sempre admirei o professor Djacir por sua obra e seus valores kantianos. Mas tremi na base. Havia muito tempo não lia Djacir Menezes. Desembarquei no Rio de Janeiro no começo da tarde daquele mesmo dia e, mala deixada no Hotel, dirigi-me à Biblioteca Nacional. Feitas as apresentações, pedi Djacir Menezes pra ler. A bibliotecária, nação de gente com quem tenho afinidades múltiplas, inclusive dois filhos lindos e uma bela convivencia de 23 anos, indicou-me um livro. Resisti: quero pelo menos tres para ler até segunda feira de noite, data marcada para a entrevista pra televisão. Lembro como se fosse hoje; As Elites Agressivas, Princípios de Sociologia, Estudos de Sociologia e Economia. - Os três, indagou a guardiã do vetusto tesouro da Biblioteca Nacional? Sim, os tres. E lá fui eu pro hotel. Armado de bastante água no frigobar, biscoitos e um desejo intenso de fazer uma boa entrevista dei-me ao encantamento da leitura. Quinta de noite, sexta o dia todo, sábado e domingo. Sem sair do hotel pra ver sequer uma bunda em Ipanema, Copacabana ou um chopp no Lhamas, onde passei grande parte da minha Juventude Paissandu. Exausto, dormi feito um anjo de domingo pra segunda. À noite Deus botou à minha frente o ídolo e o mito. Puro como diamante, límpido e simples como água de mina, lá estava o homem escondido entre um zilhão de livros onde só cabiam ele e a cadeira de sentar. Eu e o cinegrafista Carlinhos, da TV Globo do Rio, nos viramos como podemos. Duas horas de gravação para no fim ouvir dele, depois de perguntar como ia sua, dele, relação com Deus...- Este campo eu deixo pra minha mulher. Ela é tão generosa que me deixa usar parte de seu apartamento pra por meus livros e se entende muito bem com Ele.
Era ateu. E gênio.


Em tempo - Devolvi os livros à Biblioteca Nacional na manhã da segunda feira.

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