Reportagem especial

De carne de porco a cursos, missão comercial busca mais acesso à China

Cerca de 300 empresários irão acompanhar visita de Dilma ao país.

Brasileiros pedem fim de obstáculos para entrada de produtos brasileiros.

Darlan Alvarenga
Do G1, em São Paulo

De olho em novos negócios e nos consumidores do mercado chinês, empresários brasileiros seguem para a China para acompanhar a visita que a presidente Dilma Rousseff fará ao país, de 12 a 15 deste mês. A missão comercial, organizada pela Confederação Nacional da Indústria (CNI) e Ministério das Relações Exteriores reunirá cerca de 300 pessoas, com representantes de mais de 150 empresas.
Temos possibilidade de ampliar o acesso ao mercado chinês para produtos como carnes, frutas, café, massas, biscoitos, vinhos e sucos”
Alessandro Teixeira, secretário-executivoo do MDIC
A visita oficial terá ainda o reforço de outras duas delegações de empresários: uma organizada pela Câmara de Comércio Americana (Amcham), e outra formada pela Câmara de Comércio Brasil e China. O interesse de ambas é identificar novas oportunidades de negócios e ampliar a atuação no mercado chinês. Parte dos empresários irá também à Canton Fair, considerada a maior feira multissetorial do mundo, que começa no dia 15.
A missão comercial busca abrir o mercado do país asiático para produtos brasileiros hoje não autorizados e diversificar a pauta de exportações para os chineses, atualmente centrada em commodities como minério de ferro, soja e petróleo.

“A cadeia agroindustrial ainda não está totalmente aberta para produtos brasileiros e temos possibilidade de ampliar o acesso ao mercado chinês para produtos como carnes, frutas, café, massas, biscoitos, vinhos e sucos”, afirma Alessandro Teixeira, secretário-executivo do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC), que coordena a missão comercial.

A lista de produtos e serviços que o Brasil tenta colocar ou ampliar no mercado chinês inclui ainda produtos mais sofisticados e de maior valor agregado como calçados, joias, softwares e equipamentos médicos, e oferta de serviços como cursos de ensino de inglês.
Segundo Teixeira, há inúmeros nichos de mercado para produtos brasileiros. “Não adianta concorrer com quantidade ou preço. O Brasil só vai conseguir ser competitivo com uma estratégia de colocação via qualidade, posicionamento de marca e design”, afirma.

A indústria calçadista, que sofre com a concorrência chinesa no Brasil, conseguiu entrar no mercado chinês em 2010 após apostar na oferta de produtos mais sofisticados. “O consumidor chinês também discrimina o produto local e considera que a qualidade e o desenho importados são melhores”, afirma Cristiano Korbes, da Associação Brasileira das Indústrias de Calçados (Abicalçados).
No ano passado, o Brasil exportou para a China cerca de 100 mil pares de calçados, o que representa menos de 1% das exportações do setor. Hoje, são 8 marcas que atuam na China. “Mais do que crescer em volume, queremos entrar com várias marcas e nos posicionar nesse mercado que possui cada vez mais uma população com alto poder aquisitivo e que busca qualidade”.

Abertura para carne suína
O setor de carne suína espera que durante a visita de Dilma seja feito o anúncio de abertura inédita do mercado chinês ao produto brasileiro, medida aguardada desde 2009, quando o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva esteve na China.
Segundo a Associação Brasileira da Indústria Produtora e Exportadora de Carne Suína (Abipecs), todas as exigências sanitárias e etapas necessárias para a o produto brasileiro poder entrar na China já foram cumpridas. “Já fui sete vezes para a China, sempre buscando a abertura”, diz Pedro de Camargo Neto, presidente da Abipecs, que participa da missão.
“A entrada de produtos como carnes exige uma série de certificações e o processo de distribuição da China não é fácil. Por isso precisamos buscar parcerias com o governo chinês, que controla toda a compra de alimentos e todos os canais de comercialização”, afirma o secretário-executivo do MDIC.

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Para o diretor executivo da Confederação Nacional da Indústria (CNI), José Augusto Coelho Fernandes, uma maior aproximação entre os governos da China e do Brasil pode ajudar na eliminação de obstáculos burocráticos para a entrada de produtos brasileiros. “Nossa principal demanda é a eliminação de barreiras não-tarifárias que impedem ou dificultam as exportações de produtos alimentares e industrializados”, afirma.
Ele critica também a escalada tarifária, isto é, o emprego de tarifas de importação crescentes conforme o grau de processamento de um produto. “Produtos in natura têm acesso livre, mas dependendo do grau de industrialização as tarifas ficam mais elevadas, restringindo as exportações de produtos de maior valor agregado”, explica.

Protecionismo chinês
Segundo Mario Antonio Marconini, presidente do conselho de relações internacionais da Fecomercio-SP, a China ainda é protecionista com relação a algumas atividades e costuma adotar medidas arbitrárias. "O governo chinês já chegou a recusar uma carga de soja que já estava no meio do caminho sob a alegação de que o produto estava contaminado só para renegociar preço", diz.
Durante a viagem de Dilma, é grande também a expectativa em torno de novos contratos de compra de aviões da Embraer e de uma resolução do governo da China sobre a continuidade das operações industriais da empresa no país. A fabricante de aeronaves afirma que tem interesse em continuar na China, mas aguarda uma autorização para que possa mudar a sua linha de montagem e ter liberdade de produzir diferentes modelos. Atualmente, as instalações da Embrae, em Harbin produzem apenas o jato comercial ERJ-145, cuja demanda caiu nos últimos anos. A fabricação de modelos mais sofisticados tem sofrido resistência do governo chinês, que começou a produzir jatos comerciais concorrentes.

Desafios
A missão comercial reúne diferentes perfis de empresários: interessados em conhecer melhor o ambiente de negócios na China, empreendedores que já atuam no país e buscam abrir novos mercados, donos de empresas que buscam parcerias ou tentam entender como a China pode afetar seus negócios e aqueles que tentam eliminar os obstáculos para atuar no país
Um dos fatores que dificulta o acesso ao mercado chinês é o desconhecimento das regras locais e a dificuldade com a língua, o mandarim. “As empresas querem fazer negócios, mas têm dificuldade para entender a legislação e nem sempre sabem como atuar. E falta muito conhecimento também paras as empresas chinesas. Por isso o estreitamento das relações é tão importante”, afirma Camila Moura, gerente de comércio exterior da Amcham.

O empresário Carlos Wizard Martins, da multinacional brasileira Multi, conta que entre a decisão de atuar na China e a abertura da primeira escola de idiomas da rede Wizard na China, em maio de 2010, passaram-se quase 12 meses. “Não imaginávamos que ia levar todo esse tempo. Para apostar na China é preciso se valer da paciência oriental e ter visão de médio e longo prazo”, diz.
O Brasil não consegue competir em preço com a China, mas tem produtos de primeira linha em muitas áreas que podem atender a classe A chinesa que sozinha representa mais de 70 milhões de pessoas"

Kevin Tang, diretor da CCIBC
Ele conta que para abrir a primeira escola de ensino de inglês na China teve quer fazer um depósito de cerca de R$ 400 mil em moeda local. “Na área de educação, o governo exige uma espécie de seguro para o caso de eventualmente a empresa deixar de operar. O que é algo impensável no Brasil”, diz o empresário, que acompanha a missão comercial de olho em parcerias locais.

O grupo está para abrir a terceira unidade de ensino de inglês na China e planeja chegar a um total de 10 até o final do ano com o início da oferta de franquias para investidores chineses. A empresa também acaba de assinar um acordo para oferecer o ensino de inglês para 10 mil alunos da rede pública de Xangai.

“É um mercado gigantesco, para mais de 50 anos, e a demanda por escolas de idiomas é muito grande, sobretudo o ensino de inglês voltado para negócios”, afirma o dono da rede Wizard.
A Câmara de Comércio Brasil e China (CCIBC) estima que existam hoje mais de 130 empresas brasileiras estabelecidas na China. “O Brasil não consegue competir em preço com a China, mas tem produtos de primeira linha em muitas áreas que podem atender a classe A chinesa que sozinha representa mais de 70 milhões de pessoas”, diz Kevin Tang, diretor da CCIBC.

Agenda dos empresários
A agenda da missão comercial á China começou nesta quinta-feira com uma rodada de negócios em Hong Kong. Na segunda-feira (11), empresários e representantes do MDIC realizam uma reunião de coordenação preparatória, em Pequim, com representantes da embaixada brasileira e da Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (Apex-Brasil).

No dia 12, a missão se reúne com empresários e membros do governo chinês e participa do seminário “Diálogo Brasil-China para Além da Complementaridade”, no qual Dilma deve fazer o discurso de encerramento.

No dia 13, alguns integrantes da delegação seguirão para Sanya, onde Dilma participará da cúpula dos Bric, grupo formado por Brasil, Rússia, Índia e China. Outros empresários irão para a Canton Fai e a feiras de eletrônicos, informática e do setor automotivo nas cidades de Hong Kong e Xangai.

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