Horóscopos

Uma cronica de Airton Monte
Mamãe era dessas que acreditavam piamente nas mensagens dúbias gravadas nos signos astrológicos
A maioria dos meus amigos mais chegados não acredita ou faz uma indisfarçável cara de desdém quando caio na besteira de contar-lhes que sou um assíduo leitor de horóscopos. E geralmente me perguntam como é que um indivíduo como eu, metido a ares de intelectual, dono de uma modesta carga de conhecimentos, inclusive aqueles de cunho cientifico, pode perder seu precioso tempo consultando os múltiplos horoscopistas de plantão que povoam as páginas dos jornais. Claro que fico um tanto quanto encabulado e tento justificar minha atitude desarrazoada sem ter como dar-lhes uma explicação, uma justificativa plausíveis para essa minha mania que cultivo há mais tempo do que eles pensam sequer imaginar. Habitualmente fico ostentando uma cara de bobo que não tem mais tamanho.

Claro está que não levo muito a sério o que me profetizam as modernas pitonisas dos signos a respeito do meu destino, do meu futuro próximo ou distante. Todavia, me escapa à razão e ao intelecto o motivo pelo qual, mal recebo os jornais do dia, lá estou eu a procurar, prenhe de uma inexplicável curiosidade, o que me predizem os magos hodiernos tal e qual costumavam fazer os antigos que buscavam respostas para suas dúvidas nas vísceras dos animais, sob a batuta dos sacerdotes. Talvez porque haja aprendido, desde criança, com minha mãe, uma compulsiva leitora de horóscopos. Quem sabe, dela não herdei o mesmo hábito de saber o que lhe reservavam os augúrios preditos nos matutinos. Mamãe era dessas que acreditavam piamente nas mensagens dúbias gravadas nos signos astrológicos.

Tais esquisitices maternais por vezes se transmitem aos filhos como se fossem uma falsa herança genética e que seguimos praticando pela vida afora, mesmo que tenhamos plena consciência que não passam de tolas superstições sem qualquer fundo de verdade. Essa mania de consultar horóscopos tenho absoluta certeza que peguei da autora dos meus dias. Assim como tantas outras que ainda hoje, já velhusco, permaneço seguindo ao pé da letra feito um menino fazendo o dever de casa. Cobrir todos os espelhos da casa quando abundam relâmpagos durante os temporais, não poder ver um sapato nem chinelo virados de cabeça pra baixo sem imediatamente desvirá-los para não atrair a má sorte. Nem botar os pés fora de casa na Sexta–feira Santa, porque algo de ruim pode me acontecer. Jogar fora um ínfimo pedaço de pão? Nem pensar. Chama a miséria para nossa mesa, visto que pão é um alimento sagrado.

Hoje, como sempre, não consegui resistir ao irracional impulso e eis-me, às escondidas de todos, lendo o que espera nos horóscopos aqueles como eu, nascidos sob o signo de Touro. Um deles me diz o seguinte: ”A sua vida deve ser construída com base na sua confiança. O que lhe faz ser mais feliz? É momento de investir com muita força nisto. Uma semana para investir em você e conquistar mais espaço profissional”. Não contente, procuro outra opinião. E encontro:” O momento deve ser mais harmônico em sua vida profissional. Seu signo não deve ficar ligado apenas aos aspectos materiais, ficar preso em ideias passadas, ou em seu mundo particular. Cultive o seu coração”. Como se vê, nada mais descubro do que o óbvio ululante, cintado de vermelho berrante, com uma melancia gigante pendurada ao pescoço. Acho que não passo de um rematado abestado, bem sei, mas amanhã estarei cumprindo idêntica idiotice, fazendo valer minha pertença ao numeroso clube dos paspalhos.

Airton Monte é médico e um cronista genial da vida cearense. Escreve no Jornal O Povo.

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