Cirugião carioca fez plástica em Gaddaffi há 16 anos


Reportagem especial do blog do Josias de Souza
Ele se chama Liacyr Ribeiro. Já foi presidente da Sociedade Brasileira de Cirugua Plástica.

Mantém no Rio de Janeiro dois consultórios –um no bairro de Botafogo, outro na Barra da Tijuca. Opera também em Napoles, na Itália.

Em 1995, Liacyr, hoje com 70 anos, recauchutou a face do ditador líbio Muammar Gaddafi. Operou-o num bunker, em Trípoli.

Decorridos 16 anos, ele relatou a experiência à repórter Cristiane Segatto. Por que falar agora, depois de tanto tempo?

“Não estou fazendo isso para atrair clientes para minha clínica. Contar que operei Gaddafi é antipropaganda, porque, afinal, ele não está com boa aparência...”

“...Minha intenção é contribuir para a compreensão de uma figura histórica em torno da qual há muita especulação e pouca informação”.

Disse ter sido atraído à capital da Líbia por Mohamed Zaid, então ministro da Saúde de Gaddafi.

Mohamed convidou Liacyr para participar do I Congresso Pan-Arábico de Cirurgia Plástica, realizado na Líbia, em 1994.

Fez no congresso uma exposição sobre plástica de mama, sua especialidade. Súbito, o ministro líbio convidou-o para visitar uma "pessoa querida".

Conduziu-o à presença de Gaddafi. Conversaram numa tenda, montada no interior de uma casa.

“Ele apertou a minha mão e, num inglês impecável, aprendido quando estudou estratégia militar na Inglaterra, explicou o que queria” –uma plástica facial.

“Ele disse que estava no poder havia muitos anos e não queria que os jovens o vissem como um velho”.

Liacyr recomendou um lifting facial completo. Gaddafi refugou. “Queria deixá-lo com o rosto bem esticadinho, mas ele não aceitou...”

“...Pediu uma intervenção natural, que não deixasse vestígios, como uma cicatriz atrás da orelha”.

Lero vai, lero vem Gaddafi disse: “Ok Vamos fazer a cirurgia hoje”. Surpreso, Liacyr empilhou ponderações.

Precisaria de material, assistentes, anestesistas. Auxiliado pelo médico particular de Gaddafi, um paquistanês, conseguiu convencê-lo.

Agengou-se a cirurgia para o ano seguinte, 1995. Deu-se em dois encontros. Num, Lyacir extraiu gordura da barriga do ditador.

Com o material recolhido, preencheu os sulcos da face do paciente, amenizando-lhe a flacidez das maçãs do rosto. Teve dificuldades para recolher a gordura.

“Gaddafi era saradaço, se exercitava muito. Tinha uma academia completa dentro do bunker e uma piscina de 100 metros”, conta o cirurgião.

Além da academia, o bunker era equipado com um gabinete odontológico –tocado por uma dentista búlgara— e duas salas de cirurgia. Coisa fina. Bem equipadas, as salas dispunham até de UTI.

No segundo encontro, Liacyr fez-se acompanhar do colega Fabio Nacach. Especialista em implante capilar, agiu para deter a calvície de Gaddafi. E Liacyr remoçou as pálpebras e atenuou uma cicatriz na testa do ditador.

A cirurgia ocorreu em horário inusual: duas da magragada. Gaddafi não autorizou senão a anestesia local. Manteve-se consciente.

Segundo Liacyr, o paciente tinha receio de morrer ou de ser morto durante uma anestesia geral.

Os médicos brasilerios foram auxiliados por dois anestesistas –um russo e um egípcio-, além de uma instrumentista ioguslava.

Quando a operação estava pela metade, Gaddafi ordenou uma parada geral. Queria comer um hambúrguer.

O resultado da plástica, diz Liacyr, agradou Gaddafi. O médico foi retido em Trípoli, para acompanhar a recuperação do ditador.

Decorridos dez duas, Gaddafi o liberou. Disse: “Este lugar, sem mulheres e sem bebida, deve ser um sacrifício para você. Pode ir embora”.

A caminho da vizinha Tunísia, Liacyr receou que Gaddafi talvez não desejasse que a cirurgia deixasse de ser um segredo:

“Pensei: agora estou morto. Este carro vai explodir antes de chegar à fronteira com a Tunísia”.

Quanto cobrou? Nada, diz o médico. Por quê? “Ele era, ao mesmo tempo, um estadista e um ditador. Achei melhor não dizer nada sobre dinheiro”.

Não saiu da experiência de mãos vazias, contudo. O pseudoestadista incumbiu o ministro da saúde de entregar a Liacyr um envelope recheado com dólares e francos.

Liacyr não diz quanto recebeu. Afirma apenas que foi mais do que cobraria pelo mesmos procedimentos no Brasil.

Gaddafi voltaria a requisitar a presença do médico. Alegando problemas de doença na família, Liacyr respondeu que não poderia viajar a Trípoli.

“Acho que ele se ofendeu”, diz o cirurgião brasileiro. Jamais voltaria a ser contactado.

A julgar pela aparência medonha de Gaddafi, o ditador não há de ter encontrado outro cirurgião disposto a atenuar-lhe os efeitos do tempo.

Hoje, além da feiúra física, expõe ao mundo os horrores inaturais do poder longevo.

Às voltas com uma insurreição que tenta interromper 40 anos de ditadura, Gaddafi bombardeia seu próprio povo. Precisaria de uma plástica na alma.

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