Cada um deixa saudade à sua moda

Um bilhete do arquiteto Herbert Rocha para o Padre Zé Linhares, depois da partida do irmão dele, o Padre Jairo Linhares Ponte, que foi dar aulas no céu.
Caro Pe. Zé,

Não fui ao enterro nem à missa de sétimo dia do Pe. Jairo. Não foi displicência, nem angustia e nem tristeza. Simplesmente eu acho que o funeral, embora necessário, não combinaria em nada com o que foi o meu professor de Inglês.

Quando eu ouvia o Pe. Jairo tocar sua sanfona nas suas aulas do Colégio Sobralense, marcando o compasso com o sapato batendo no birô escuro de madeira que lhe servia de banco, eu aprendi alguma coisa que não era exatamente a matéria que ele estava ali para ensinar. É que ele não se continha na sua musicalidade. Já que a aula era de inglês, quase sempre tocava e cantava conosco My Bonnie lies over the ocean. Quando eu ouvia aquilo eu imaginava uma garota qualquer deitada languidamente sobre uma canoa em um mar de águas calmas. Aquele mar parecia o céu.

Não sei bem como ele descobriu que eu tocava flauta doce. Era talvez 1979 quando o padre Jairo passou a me convidar nos finais de semana para tocar com ele em sua casa. Éramos quatro: ele ao piano, Dr. Crisanto no violão, eu e o Zé Ricardo na flauta doce. O repertório não era aquele da sala de aula. Tocávamos Bethoven, Schubert, Lizt e Pichinguinha. Eu, analfabeto musical, me esforça para não atrapalhar o trio que era muito bom.

Estas lembranças saltaram à minha mente quando soube que o Pe. Jairo foi repousar nas águas calmas do céu de My Bonnie. São memórias que trazem my Bonnie de volta pra mim. É assim que quero me lembrar dele.

Um Abraço solidário e amigo.
Herbert Rocha

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