Luta: a vida alegre de um povo sofrido





Um sábado comum de peregrinação na Praça do Ferreira

Por Macário Batista
Especial para O Estado

A disposição com que dona Maria Izabel, da Granja Portugal, encarava uma coxinha e um copo de vitamina de goiaba com molho de tomate, era de fazer inveja a qualquer menino que nunca sentiu uma dor na unha e não tem nadica de nada de colesterol ruim ou triglicérides alterados. Dona Maria Izabel veio à cidade fazer compras. Perguntei pra ela o que é que ela estava achando dos escândalos da Casa Civil. A resposta foi uma outra pergunta: “Que casa meu filho?” Dona Izabel sabe que vai votar porque quer, que já não é mais obrigada, mas diz que vai votar no Lula. Pronto.

Foi o começo da minha peregrinação na manhã de sábado pela Praça do Ferreira, um caldeirão sempre pronto a servir mil refeições, dependendo do ângulo de visão de cada um. Agora, em tempos de campanha política, o caldeirão ferve. Tem de tudo. Tiozinho balançando bandeira do Zé Serra, jovenzinha balançando o pau da bandeira do Cid, homens e mulheres procurando o ganha-pão honesto de passar um expediente (entram nos comitês às 6 e 30 da manhã, e quando é hora uma da tarde largam a missão) do dia balançando bandeira de político candidato.
E não é um ganho assim tão miserável, não. Quem é rico vai de burrico, quem é pobre anda a pé. Pra balançar a bandeira do dr. Eunício, o povão aí diz que ganha R$700 reais por mês, recebendo o dindim em duas bandas de R$350, na quinzena. “Não, não tem obrigação de votar, não, né?”, disse a Iranilda que não queria ser fotografada. Mas tava toda feliz. “A gente recebe esse dinheiro mais o dinheiro do ônibus, uma merenda de manhã cedo e o almoço. Eu acho bom”, diz ela. E pergunta se o candidato para quem ela balança o pau da bandeira vai ganhar, sem ter dito se votaria no homem, ou não.



Mais adiante, paro pra conversar com uma figurinha que toca o barco do Zé Serra. A pergunta é a mesma, porque quero saber como vai a economia da campanha. Tiozinho e seu vizinho de pedra dizem que recebem um salário mínimo por mês, em duas prestações, quer dizer, duas metades de R$ 255,00, ou R$ 510,00, que é o preço pago pelo comitê do Zé Serra, que tem um capataz vigiando o serviço deles. Também recebem o transporte de casa pra cidade, ida e volta, e almoço. Nenhum deles, e eram vários, sabia que o Zé Serra tá querendo, se for eleito, passar o mínimo pra $ 600,00 reais, o que já poderia inclusive estar fazendo.

A praça, porém, tem outras atividades e por isso mesmo está lotada de gente balanço pau de bandeira. Na verdade, só isso. O único candidato que distribuía alguma coisa útil para se vender ao eleitor é o Zé Serra, que tem um jornalzinho entregue por outra turma que não é o povo de balançar pau de bandeira e um cordel muito bem arrumado de um tal de Zé Presidente, intitulado O Trabalhador e a Patroa. Os primeiros versos já se vê, batem pesado em Tia Dilma, de quem não se viu uma única bandeira nas ruas.
“Quem é que pode falar
Que está do lado do povo;
Quem é gente boa, trabalha
Todo dia, o dia todo,
Ou quem vive a viajar,
Numa vida de patroa”.


Pois bem; especialista em pau de bandeira recebe R$ 700,00 de Eunício Oliveira, um salário mínimo de R$ 510,00 de Cid Gomes, a mesma coisa do pessoal do Zé Serra e, como comunista é bicho pobre, Lula Morais paga R$ 300,00 contos por mês, também em duas quinzenas de R$150,00 cada uma. O povo do Lula recebe um dindim pra passagem do ônibus, o almoço e um dindim de sobremesa.

SEMANA DO LIVRO
Numas cem barracas estão dispostos livros infantis. É que está havendo a Feira do Livro Infantil e parte da praça foi tomada por livreiros, empresas diversas e performances culturais, como contação de histórias para crianças, músicas infantis e papo-cabeça pra animar a data e marcar o livro como ferramenta fundamental para a vida. E olhe, tinha muita gente prestando atenção, interagindo com a moça que contava histórias e ajudava o povo a cantar. Como sempre, os desocupados e, pra não dizer que não falei de povo, lá estava seu representante, o palhaço, alegrando as massas, caricaturando a vida.

Havia deixado o carro pro argentino dar uma guaribada e, como ninguém é de ferro e eu não sou besta nem nada, aproveitei a pauta, pesei meu peso na balança da Farmácia Pasteur, vi que estava 10 quilos acima do que deveria pesar e, correndo, quase sem fôlego, como se a vida fosse acabar ali ou não valesse a pena viver mais um minuto, gastei R$4,50. Tomei um caldo de cana e comi um pastel de carne na Leão do Sul.

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