Entrevista Especial (Direito&Justiça)


"Estamos caminhando para a ditadura do Poder Judiciário"


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A crescente intromissão de juízes em matérias de caráter político e eleitoral está levando o Brasil a uma “ditadura do Poder Judiciário”. É a avaliação do advogado Paulo Goyaz, especialista em direito eleitoral e administrativo.


Dono de extenso currículo, já tendo prestado serviços de advocacia e consultoria para políticos como José Roberto Arruda, Joaquim Roriz, Marco Maciel, Gim Argello, Pedro Henry, João Pizzolatti e José Sarney, além de partidos diversos, Goyaz está no Ceará para trabalhar na campanha de Lúcio Alcântara (PR) ao Governo do Estado.

Direito e Justiça – Como o senhor avalia a chamada mini-reforma eleitoral, aprovada no ano passado?
Paulo Goyaz – Parece-me que o objetivo maior da reforma foi dar maior lisura ao pleito. Para algumas mudanças nós temos críticas e para outras nós temos elogios. Por exemplo: uma das mudanças que elogiamos é aquela em que os partidos políticos passaram a ter direito de realizar campanha, porque a lei faz uma contradição. A lei estabelece que a partir do dia 6 de julho todos os candidatos têm direito a realizar propaganda. No entanto, na fase administrativa, o candidato entra com um pedido de registro no dia 5; eles têm oito dias para fazer o CNPJ do candidato e mais três para o banco abrir a conta. Isso dá 11 dias. E mais o tempo do partido fazer o recibo. Então, por algo em torno de 15 dias, o candidato não pode fazer campanha. E isso é uma limitação da regra geral que permite a propaganda.
No dia 05 passado vi num jornal que o Ministério Público está criticando um candidato que foi visitar uma feira. Ora, desde quando é proibido um candidato visitar uma feira? Candidato tem que estar no meio do povo, pedindo voto, conversando com o povo, esse é o espírito da lei. O espírito da lei não é engessar o candidato e deixá-lo de mãos atadas. O espírito da lei é que o candidato faça a campanha a mais barata possível para que no futuro muito próximo as campanhas sejam feitas com dinheiro público. Esse é o objetivo da norma, é um ponto que achamos salutar.
Por outro lado, como foi uma mini-reforma feita às pressas. Ela tem contradições em alguns pontos. Por exemplo, no tocante a imóveis, pintura de muros, realização de comitês. A primeira parte da norma diz que constitui gasto de campanha o aluguel de imóvel particular para fins de propaganda eleitoral. A nova lei veio e disse o quê? Que não se pode pagar para fazer propaganda em propriedade particular. Então, há um confronto das duas normas. O candidato vai seguir qual? A lei posterior, a lei anterior?

DE – O TRE proíbe pintura ou placa, em muro, que excedam quatro metros quadrados. O tribunal também proíbe o dono do imóvel de cobrar pelo espaço de propaganda.
PG – O dono do imóvel pode alugar, mas não pode cobrar. Uma norma diz que ele pode alugar; outra norma diz que ele não pode cobrar.

OD – Como é que alguém aluga sem cobrar?
PG –(risos) É isso que nós vamos perguntar para o TSE, que não respondeu.

OD – A lei diz que o dono do imóvel pode fazer propaganda de forma espontânea e gratuita. Mas, se o imóvel é meu e eu quero vender o espaço para um candidato, por que eu não posso ?
PG – Veja bem. O legislador, quando trabalha às pressas, comete equívocos. Existem duas propagandas básicas em residências. Uma é a pintura no muro, uma das propagandas mais baratas que existem. Esse muro pintado custo muito pouco para o candidato. É a mídia mais barata que existe e a mais eficaz. A limitação em 4m2 é para evitar o abuso do poder econômico, que alguém pegue um grande muro em alguma avenida interessante e coloque uma propaganda gigante. O candidato vai poder usar este muro, mas dividindo a propaganda em placas de 4m2.

OE – O senhor não acha que o TSE já está entrando até na propriedade privada, e também na livre negociação, inclusive na imprensa? Porque agora foi limitado o número e a dimensão dos anúncios, e os jornais são obrigados a informarem o valor do anúncio. E a livre negociação, como fica?
PG – Naturalmente, o que a Justiça Eleitoral quer é evitar os excessos, mas, para evitar os excessos, a Justiça começa a entrar em outros campos que não são dela. A verdade é que os jornais já têm limitações, porque eles têm isenção do tributo sobre o papel, o que não ocorre com as revistas. As revistas podem fazer matérias sobre um candidato apenas. Os jornais não podem. Eles têm que dar tratamento igualitário para os candidatos.

OE – Há candidatos que se queixam de propaganda subliminar na imprensa.
PG – É muito relativo interpretar o que é propaganda subliminar. Assinei uma representação contra o candidato à reeleição [governador Cid Gomes] em função das propagandas sobre a cidade de Sobral que estão sendo veiculadas nos jornais. Está sendo dada quase uma página de jornal para a Prefeitura de Sobral. Entendi que ali tem propaganda subliminar e estou submetendo à apreciação da Justiça para saber se é ou não propaganda subliminar. Porque não é normal, em periodo eleitoral, que uma prefeitura do Interior passe a publicar, em todos os órgãos de imprensa do Estado, matéria vinculando sua divulgação, se levarmos em conta que o governador e candidato à reeleição foi prefeito de Sobral e que o prefeito atual é da linha sucessória dele. Então é questão de bom senso. Ninguém quer tirar a propaganda, mas que a propaganda também seja limitada e não seja tão ostensiva.

OE – E a propaganda na internet, que foi o grande debate, como ficou? Está liberada sem restrições?
PG – A propaganda na internet está proibida nos sites comerciais. Os candidatos podem pôr os sites deles, os blogs, os e-mails próprios, os e-mails dos partidos. Eles só precisam comunicar à Justiça Eleitoral quais são os sites e blogs que eles utilizam. Isso por quê? Para evitar os atentados. Porque a internet é utilizada mais para a propaganda negativa do que para a positiva, por ora. A tendência é mudar, a internet vai passar a ser um instrumento de propaganda positiva. O candidato tem “n” formas de fazer propaganda na internet. Eu considero o e-mail uma das formas mais eficazes de propaganda. O candidato pode substituir a perda de tempo no horário gratuito através do e-mail, assim como eu posso utilizar o e-mail para fazer propaganda negativa, só que não é recomendado que o candidato faça propaganda negativa, ele tem que fazer propaganda propositiva dele. Aí surge o problema. Porque se alguém acessa através de um site, principalmente do Oriente, o que acontece? Lá não se tem uma fiscalização. Se o candidato tiver um acesso por lá, ele manda uma propaganda negativa e não tem como rastrear.

OE – E quem não é candidato, pode abrir um site?
PG – Pode, mas se o site tiver uma caracteristica política e tiver alguma forma de receita, aí não pode. Aí a pessoa vai ter que dar tratamento isonômico.
Eu vejo a internet como um instumento que deveria ser livre, inclusive para as críticas, porque essa é uma forma de comunicação moderna. O e-mail, hoje, está presente em praticamente todas as comunidades. O cara pode não ter computador em casa, mas ele tem e-mail, ele acessa da lan house, da casa do amigo, do trabalho. O e-mail está virando um instrumento de comunicação em massa.

OE - A consulta feita pelo PPS ao TSE. Essa resolução não tem caráter vinculante.
PG – Em princípio, nenhuma resolução do TSE tem carater vinculante, mas ela é um indicativo no sentido do que a Corte vai julgar. Em relação a essa decisão, acho que o TSE não analisou com a calma que deveria. O TSE viu com profundidade a matéria e os efeitos e conseqüências dela. Se a lei permite a coligação do partido A com o partido B e com o partido C em nível nacional, e permite que os partidos A, B e C coliguem com outros partidos fora, a lei não pode proibir a utilização do horário gratuito. Quando muito eles podem estabelecer, por exemplo: se o partido A tem 15 segundos, o candidato dele só pode entrar 15 segundos. Se o partido B coligado tem 30 segundos, pode usar os 30 segundos deles. Agora, quando os partidos se coligam, com candidatos diferentes à Presidência, a tendência é retirar o candidato a presidente da propaganda. Essa é a conseqüência natural. Isso já aconteceu no passado. Se olharmos as eleições passadas para presidente, era comum que candidatos a governador não tivessem propaganda no horário gratuito de candidato a presidente em função das coligações. Acho que o TSE vai voltar atrás.

DJ– A resolução do TSE não seria um contra-senso? O Tribunal havia acabado com a verticalização e, agora, com essa resolução, (...).
PG –Fiz uma sustentação oral , no Tribunal Regional Eleitoral em Brasília. O assunto era infidelidade partidária. Abri a sustentação dizendo o seguinte: na minha vida, nunca votei para um juiz ser juiz, não admito, no regime da República Federativa do Brasil, que um juiz seja legislador. Se o juiz quiser ser legislador, ele dispute uma eleição, ganhe uma eleição e vá legislar. Porque a função do Judiciário é analisar e interpretar as leis, e não criar as leis. Cabe ao Poder judiciário interpretar o que está escrito, mas jamais baixar normas e regulamentar o que não está na lei. Acho que essa competência o Poder Judiciário não tem. Sou um critico do Judiciário atual em função disso.

DJ– O senhor acha que o Poder Judiciário atual está entrando na seara do Legislativo?
PG – Com certeza e ainda vou mais longe. No meu sentimento, nós estamos vivendo e colocando o país em uma ditadura do Poder Judiciário, porque cabe ao Poder Judiciário, agora, dizer quem pode ser candidato ou não em um futuro muito próximo. E acho que isso não é bom para o povo. “Ah, mas aquele determinado candidato é ficha-suja”. Mas o povo vota nele, e se nós olharmos onde os candidatos “ficha-suja” têm votos, nós teremos uma surpresa, porque eles têm mais votos na classe média e na classe alta do que na classe popular, se olharmos os percentuais. Com raríssimas exceções.
Então, se o povo acha que aquele político comete deslizes, mas é capaz de representá-lo, não cabe aos iluminados, só porque têm um diploma e são juízes, dizer que o povo não tem o direito de escolher esses candidatos. A norma mostra o que torna um candidato inelegível. Então essa regra não pode ser mudada dentro do processo eleitoral. A filiação partidária terminou em 3 de outubro. Os partidos compuseram sua nova base partidária em função do que havia na legislação. Foram surpreendidos, na última hora, por uma nova norma que estabelece que muita gente não era inelegível passou a ser inelegível. Houve uma mudança da regra do jogo no ano eleitoral, e isso é altamente pernicioso. No momento em que nós começarmos a abrir e permitir isso, estamos colocando na mão de sete homens do TSE e 11 do Supremo Tribunal Federal, na verdade sete mais oito. Quinze homens vão estar decidindo o futuro do país em termos políticos, quem pode ou não pode concorrer, e me parece que não é esse o objetivo da Constituição de 88, ela manteve o sistema federativo com autonomia dos três poderes.
Usam aquela a desculpa: “Ah, mas o Legislativo está corrompido”. A mídia tem trabalhado muito em cima disso. Tudo bem, o Legislativo pode estar corrompido. Mas será que o Judiciário não está corrompido? Será que o Executivo não está corrompido? Por que só o Legislativo?

DJ– Mas o Judiciário alega que está entrando na seara do Legislativo porque existiria uma brecha para tanto.
PG – Mas não está previsto na Constituição esse direito deles. O Poder Judiciário não pode substituir o Congresso Nacional, porque senão os juízes passam a ser políticos, e eu não quero ser julgado por um político, eu quero ser julgado por um juiz de ofício, com capacidade técnica e isenção para julgar qualquer pessoa. Eu vejo que há essa extrapolação.

OD – O senhor acha que, nesse caso específico do projeto “Ficha Limpa”, o TSE falhou ao se deixar influenciar pelo clamor popular?
PG – O problema é saber o que é clamor popular e o que é clamor da mídia. No meu sentimento, a mídia trava uma disputa muito grande com os políticos para saber quem reflete a opinião pública. E nessa briga dos dois, o Judiciário acaba sendo influenciado mais pela mídia. Vou dar um bom exemplo: a crise política que houve em Brasília, As denúncias do governador José Roberto Arruda.. O governador foi preso quando ainda detinha 25% dos votos do eleitorado do Distrito Federal. Por que isso? Porque a opinião pública que refletiu as decisões contra o governador era a da mídia, e não a opinião pública do povo de Brasília. As manifestações que ocorreram em Brasília nunca passaram de mil pessoas e eram sempre as mesmas pessoas.
Uma coisa é a opinião pública da mídia, do jornalista, do dono do jornal, da TV. Outra coisa é o sentimento da grande maioria da população. Então, quem detém esse controle? É o político ou o meio de comunicação? Nessa briga entre os políticos e os meios de comunicação, a influência dos meios de comunicação junto ao Judiciário acaba sendo maior que a do povo, porque o povo, normalmente, é uma maioria silenciosa.

OD – O senhor acha que o Judiciário está julgando sob pressão da mídia?
PG – Com certeza. O Judiciário está agindo emocionalmente em função do clamor popular. A ministra Carmen Lúcia, no voto dela que aprovou o “Ficha Limpa”, foi muito clara nesse sentido, de que o clamor popular para aprovar a lei gerava a obrigação de a lei entrar em vigor imediato. Agora, qual clamor popular? Um milhão de brasileiros que assinaram? Será que, desse um milhão, todos sabiam o que estavam assinando? Será que os 199 milhões de brasileiros restantes era a favor? São coisas que a gente deve analisar com calma.
No caso da lei do “Ficha Limpa”, o Congresso deveria ter parado, adotado a lei, mas estendendo-a para o Poder Judiciário, o Poder Executivo e para o quarto poder, que é o Ministério Público. Eu acho muito mais grave um juiz denunciado de corrupção continuar julgando do que um político denunciado de corrupção continuar atuando como político. Se é para moralizar o Brasil, se é para ter “ficha limpa”, tem que moralizar todos os segmentos dos quatro poderes.

OD- Qual será a maior fonte de conflitos judiciais entre os candidatos na eleição deste ano?
PG – No primeiro momento será o problema da “Ficha Limpa”. Os candidatos que tiveram ações declaradas de abuso de poder econômico - o próprio governador está sujeito a ser declarado inelegível, porque ele ainda tem uma ação em tramitação, que não foi julgada ainda, sobre abuso de poder econômico. Se eventualmente o TRE declarar, ele está afastado da campanha.

Penso eu - Não é de hoje que este blog e a coluna de papel do Jornal O Estado, criticam o comportamento dos políticos que permitiram que a Justiça cada vez nais se intrometesse no mundo da política. Faz anos falamos disso aqui e com os políticos com quem lidamos no dia-a-dia de nosso mister. Eles nunca tem respostas que agora aí acima o advogado Paulo Goiás oferece.

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